segunda-feira, 24 de novembro de 2008

A Economia Real

Não é de hoje que o setor financeiro é acusado de "roubar" as pessoas e de não produzir nada de valioso para a sociedade. Pode-se buscar exemplos em livros religiosos (Torá, Novo Testamento), em escolas filosóficas (escolástica), literatura (Shakespeare, em "O Mercador de Veneza, Dante em "A Divina Comédia") e em vários economistas antigos (não me lembro mais dos nomes, alguém me ajuda aí).

A crítica está em geral baseada em argumentos ridículos, que parecem resultado de um misto de ignorância e preconceito. É preciso ser um burocrata que nunca saiu da repartição ou um acadêmico que nunca saiu da universidade para não perceber a importância do mercado de ações, derivativos, títulos de dívida, dos fundos de venture capital e private equity e das operações estruturadas para diversificação de riscos (indústria de seguros), previdência e, principalmente, financiamento de investimentos.

O oposto do setor financeiro é muitas vezes chamado de A Economia Real, que fabrica "produtos de verdade, que se pode embrulhar" (palavras sábias de Élio Gáspari, que nunca produziu nada de verdade na vida segundo sua própria definição).

Para mim, o oposto da Economia Real no Brasil é o Governo. A não ser que alguém me convença de que o produto do trabalho do setor público vale 40% do PIB brasileiro.

20 comentários:

Bernard Herskovic disse...

Sua inquietude me lembra a definição de trabalho improdutivo e produtivo de K. Marx, este é o trabalho que produz mais-valia e aquele é o caso contrário (pelo que eu me lembre, corrija se estiver errado, ok?). Então, no governo o trabalho é improdutivo, funcionários públicos pela definição são improdutivos, bolsistas de mestrado são improdutivos e por aí vai.

Porém, ignorante é aquele que não reconhece uma das maiores VIRTUDES do modo de produção capitalista: o seu indispensável sistema financeiro.

Guilherme Lichand disse...

vocês precisam ver isso!!

http://ecoufes.blogspot.com/

incrível esse vídeo com os comentário de Peter Schiff sistematicamente antecipando a crise e seus mecanismos desde fim de 2006 e sendo ridicularizado nos noticiários

Tiago Caruso disse...

Eu estava com esse texto do Gaspari engasgado na goela. Quase escrevi um post sobre ele. Não aguento mais a insistência em menosprezar o que não compreende.

Segundo a definição dele só é produto o que se pode embrulhar. Perfeitamente, a partir de agora me sinto no direito de usar tudo que ele escrever como se fora meu, afinal jornal a gente pode embrulhar, texto não. A mim pertencem FFHH, a madame Natasha e o Eremildo. Não só os personagens como os paragrafos que os acompanham poderão ser assinados por mim. Excelente!

Tiago Caruso disse...

Governo não inclui muitos advogados. Se bem que eu acho que setor jurídico é mais uma medida de peso-morto.

Ricardo Leal disse...

Quanto ao Gaspari, venho tendo que aceitar várias de suas colunas já há um tempo pq muitos o consideram um cara correto. No entanto, o fato dele ser ou não correto não tem nada a ver com possíveis besteiras que ele fala e quando o assunto é economia ele fala muitas.
Já havia lido textos semelhantes dele antes e provavelmente lerei outros...

Anônimo disse...

http://www.bndes.gov.br/conhecimento/visao/visao_44.pdf

Esse artigo explica bem a filhadaputagem financeira que fizeram no subprime. As proprias agencias de riscos que classificavam os papeis ja admitiram que houve um moral hazard e que era do interesse dos mesmos de superestimar seus ratings.

Isto é um exemplo de uma bela inovaçao financeira.

a maior critica qu se tem ao pessoal qu ganha "sem produzir um pbotao"(palavras do Lula agora) é que elas ganham em cima da renda, p ex, um herdeiro milionario que aplica tudo em titulo publico brasileiro recebe cerca de 12 mil mensais e nao precisa trabalhar. Justo ou nao? Isso é de cada um.

O mercado financeiro é importantissimo sim, porem tem de ser mt bem regulado se nao leva a quebra todo mundo.
Se nao fosse intervençao governamental, os bancos americanos quebrariam um atras do outro, os correntista perderiam suas aplicaçoes, a empresa mais pordutiva em papel e celulose ja tria ido pro saco, a maior em automoveis idem, e varias outras gigantes com problemas que se o governo nao intervem alem de quebrar ia bota muitos na rua, alem de todo o seu poder de encadeamento.

Pra terminar uma frase do Marx.
Tudo que é solido se desmancha no ar. Cerca de 27 tri de dolares foram perdidos na crise. o que o mundo produz, em valor, em 6 meses sumiu em 2 no mercado. Isso com a ajuda do governo, senao era pior

Petterson Molina Vale disse...

Seria muito mais legal gerar renda sem produzir coisa nenhuma. Não haveria pressão sobre a natureza, já que não se precisa de coisa nenhuma para se produzir coisa nenhuma. E todos teriam $$ suficiente para consumir.

Mas não se teria o que consumir! A menos que importássemos de outro planeta.

É necessário produzir coisas que se podem embrulhar. Sem deixar de produzir SERVIÇOS, pois comércio, transporte, comunicações e finanças têm muita serventia, como dizem os meus conterrâneos machadinhenses, para complementar as coisas embrulháveis.

O terciário representa aproximadamente 60% do PIB. E isso não seria nada mal num país desenvolvido. Mas no Brasil, 13,2% do emprego gerado nesse setor é de "domésticos remunerados", recebendo 1,2% da renda gerada. Além dos 16,6% de "outros", que incluem camelôs, limpadores de parabrisas e traficantes, recebendo 3,3% da renda. O setor financeiro, que gerava 4% do emprego em 1989, gerou apenas 2,1% em 2004, apesar de, possivelmente, ter remunerado bem melhor do que camelôs e empregadas domésticas.

Como eu estou me lixando para a estrutura do emprego, me interessa apenas gerar fluxos trilhonários de capital pra lá e pra cá. O negócio é BOVESPA e o benchmark são as ilhas Caimã (como se escreve isso?).

Não, brincadeirinha. O BNDES financia de verdade, e outros bancos também fazem algumas operações de crédito com serventia para a economia. Mas as tais operações estruturadas com obrigações de pagamento de... sinceramente, precisam ser rapidamente abolidas. Só servem para criar as tais pirâmides de papéis, que, por sinal, não são novidade do Século 21, nem do Século 20, como bem lembrou aquele economista velho de cujo nome o autor do post não se lembrava: Galbraith (o pai).

Bernard Herskovic disse...

Gustavo,

E tudo que foi construído a partir desse sistema “maluco” (que eu acho genial)? Devemos ponderar um pouco as acusações, porque muito do que se construiu a partir da “filhadaputagem financeira” ficou. Várias pessoas e empresas ganharam dinheiro, consumiram, investiram,... Se a taxa intertemporal de desconto for suficientemente baixa podemos até falar que valeu a pena para alguém (para quem dá a mínima para o futuro... brincadeira!)

A usura é anterior ao capitalismo. Um herdeiro milionário deve considerar nas suas alternativas trabalha ganhando ainda mais ou não trabalhar ganhando seus rendimentos financeiros (a sua opção de fora aumenta). Há ainda os impostos que o herdeiro deve pagar ao receber e ao aplicar a herança. O dinheiro do milionário ainda gera emprego e pode aumentar a liquidez no mercado secundário de papéis!

A frase do Marx que você citou é do manifesto comunista e não tem nada a ver com o nosso contexto (p.5 do manifesto: http://www.marx.org/archive/marx/works/download/manifest.pdf). O manifesto comunista é muito emotivo, é realmente um manifesto político. Todavia, na passagem em questão Marx discorre sobre a necessidade do sistema capitalista sofrer constantes transformações para “superar”(adiar) as contradições inexoráveis ao seu modo de produção. Daí tudo que é sólido (permanente) se desmancha no ar (é transformado pelo sistema).

Voltando ao nosso assunto. Em termos marxistas, o dinheiro que “desapareceu” nunca existiu, era capital fictício (sem valor por não gerar mais-valia, mas que tem preço, ver capital livro 3 volume 5 cap. 23 a 27 para as definições precisas) e esse capital fictício, em última instância, é oriundo da transformação, no mercado primário, do capital-dinheiro em capital-produtivo e capital-fictício, este permanecendo no mercado secundário e aquele na esfera da produção. Então, o que o mundo produz em valor em seis meses permanece (claro que o seu valor continua sendo determinado pelo tempo socialmente necessário para a sua produção) e o que o “mercado” sumiu não tem valor, era capital fictício. Essa explicação rápida é nos termos de Marx, se a sua teoria está correta ou não, é outra longa discussão que, a meu ver, não tem resposta.

M disse...

Eu já vi que eu vou ter que fazer outro post sobre os "mitos" do mercado financeiro...

Tiago Caruso disse...

Sou daqueles que acham que não há quase nada mais rude do que zombar da ignorância alheia, mas talvez zombar do conhecimento alheio consiga ser pior. Pois é exatamente isso que o Gaspari e aparentemente alguns seguidores fazem.

Argumentar que aquilo que não se pode tocar (ou embrulhar) não existe ou não tem valor é um desrespeito a inteligência das pessoas que pagam por esses bens. Felizmente não vivemos em uma sociedade aonde alguém dite o que tem valor e o que não tem. Quem julga isso são as pessoas que pagam por esses produtos.

O Gaspari e seu séquito podem achar que derivativo não é produto, mas quase todas as empresas que exportam pensam o contrário. Elas acreditam que negociando derivativos podem diminuir seus riscos e por isso pagam por eles e ninguém tem o direito de dizer que estão erradas. O fato de que algumas (sadia, aracruz) agiram irresponsavelmente não implica que as outras estavam erradas e tampouco que deixarão de fazê-lo.

Infelizmente é mais fácil dizer que o que não conhecemos não tem valor do que tentar compreendê-lo.

Tiago Caruso disse...

Um herdeiro milionario viver de renda dos títulos é justo?

Depende do conceito de justiça que se use. Se formos por Aristóteles, justo é dar a cada um aquilo que é seu. Bem, o título é dele então é justo. Como ainda vivemos em um Estado democrático de direito, vamos por Kelsen: justo é o cumprimento da lei democrática.

Neste país há uma consituição, promulgada por uma assembléia constituinte eleita pelo voto direto. Decorrendo dela há leis e ambas garantem o respeito aos contratos.

Portanto o filha da puta do milhonário, beócio, que não faz nada, fuma charuto, sacaneia os pobres e zomba do proletariado e de Deus tem o direito de receber 12 mil mensais e isso é legal, é democrático e é justo.

Petterson Molina Vale disse...

O setor terciário representando 66% do PIB, é um tiquinho difícil argumentar que serviços, aquilo que não se embrulha, são destituídos de valor. Duvido que alguém tenha dito que a comercialização de derivativos não deva ser remunerada.

A diferença entre serviço e produção física está nos encadeamentos para trás e para frente. Produtos de alto valor agregado, como aviões, estimulam uma infinidade de setores da economia, diferente de compras na Daslu.

M disse...

Será?

Guilherme Lichand disse...

que achismo desenfreado

eu atualmente ando intrigado com algo que tem um sabor desse assunto... excelentes cérebros vão para o mercado financeiro porque eles pagam muito mais que o 'setor produtivo', o que leva muita gente a acreditar que a economia poderia estar melhor num outro contexto.

Aí eu acho que se tem um ponto, porque a concentração ABSOLUTA dos cérebros com maior capacidade computacional nos bancos e nas universidades caracteriza ineficiência alocativa...

em particular, os jovens talentos todos que saem das faculdades de administração de SP estão em 95% dos casos como estagiários-efetivados / trainees de instituições financeiras fazendo trabalho de burro. Poderiam - pelo menos alguns deles - estar em outros setores, tendo novas idéias e alocando mais eficientemente os recursos, acrescentando mais para o produto.

O salário no setor financeiro não reflete a produtividade marginal.

Anônimo disse...

Meus caros,
EU DISCORDO TOTALMENTE!!!!!!
NUNCA LI UM ABSURDO MAIOR!!!!!!!
Como assim, "a crítica está em geral baseada em argumentos ridículos, que parecem resultado de um misto de ignorância e preconceito"????????
Esta crítica não parece, ela É resultado de um misto de ignorância e preconceito"!!!!!!!
Saudações
PS: Para alguém aí que falou sobre a não importância de alguns ativos financeiros, eles só existem quando efetivamente conseguem transferir renda/bem-estar entre períodos e/ou estados da natureza. Se eles não fazem isto, não tem demanda para eles.
PS2: Dada minha memória sobre o "tudo que é sólido desmancha no ar", acho que está no capital. Se refere ao fim das sociedades tradicionais pelo sistema capitalista, processo este louvado pelo Marx (aumenta absurdamente a produtividade do trabalho e permite libertar o homem da idiotia da vida no campo, alguém se lembra disto?).
PS3: Apesar de torcer para que professores universitários ganhem igual às péssoas do mercado financeiro, isto só vai acontecer quando nossa produtividade marginal (em termos de bem-estar) chegar na dos caras (vide o primeiro PS).

M disse...

Guilherme,

Achismo seu dizer que o salário do setor financeiro não reflete a produtividade marginal.

Pior ainda é você dizer que os caras fazem trabalho de burro. Tem muita gente que acha que burrice é passar 40 anos da vida provando teoremas inúteis (e o seu comentário é tão ignorante quanto o dessas pessoas). Vou ter que te incluir no time das pessoas que eu critiquei no meu post.

Bernard Herskovic disse...

1. O salário ser igual a produtividade marginal. Cara, eu acho extremamente difícil concordar ou discordar, porque a meu ver produtividade marginal é um conceito teórico e nada próximo da realidade que é comum no vocabulário dos economistas em geral. Trabalho de burro para mim é, por exemplo, montar tabelas e muita gente boa faz! Qual é a produtividade marginal do cara que monta as tabelas? É igual ao seu salário? Não sei.

2. Ineficiência alocativa. Guilherme, eu acho que o seu exemplo está muito restrito a economia, será que outras áreas têm esse aparente problema? Por outro lado, o fato das pessoas escolherem suas ocupações com base no retorno esperado, mostra que cada indivíduo está tomando decisões ótimas. Logo, se existe outro “equilíbrio” pareto superior, cabe ao Estado intervir? Ou será que existem instituições capazes?

PS. A frase “tudo que é sólido...” está no manifesto, logo na introdução. Se você ainda não têm certeza olha no link para o manifesto na íntegra: http://www.marx.org/archive/marx/works/download/manifest.pdf na p.5. Agora, a “idiota da vida no campo”, me poupe.

Guilherme Lichand disse...

Rafael,

veja direitinho a quem eu restringi meu comentário para não dar margem a esse tipo de polêmica: o pessoal que acaba de terminar a graduação, e vai para instituições financeiras. Esses indivíduos não possuem nenhum conhecimento que o distingua de alguém com Ensio Médio que vá contribuir para o desempenho da instituição. Ainda assim, esse cara sai ganhando um bom salário (um excelente salário quando comparado com o cara do Ensino Médio), e ainda recebe um ótimo bônus (vis a vis seu salário mensal) caso a instituição vá muito bem.

Se esforçando igualzinho, a instituição pode estar indo muito bem ou muito mal (em termos absolutous ou relativos), o que sugere fortemente que seu esforço é praticamente irrelevante para o desempenho (não estou falando do CEO, não estou falando do analista senior).

Ele não participa em nada de decisões que são relevantes para o desempenho da empresa. Esse mesmo cara, estaria possivelmente contribuindo mais para o desempenho de uma empresa (isso não tem nada a ver com bem estar social, mas com produto marginal, acho um conceito palpável, sim, Bernard, pelo menos em termos aproximados).

Ainda assim, seu salário é muito maior no setor financeiro. É algo para ser entendido, e é atitude ignorante afirmar: mas a gente observa, então deve ser eficiente. Qual é o cálculo da empresa ao pagar esse salário para o estagiário/trainee?

Eu acho que o argumento segue pelo caminho de que em cada 100 negos que passam pelo banco, 1 deles tem uma capacidade excepcional de gerar milhões para a instituição, mas isso não é observável nem passível de screening. O banco então faz uma aposta, paga um salário na média dessa "produtividade potencial" - o caso típico de seleção adversa, mas num contexto dinâmico.

O resultado de equilíbrio geral da seleção adversa nesse mercado é que mentes aptas (não necessariamente a gerar dinheiro para bancos, mas a trabalhar duro e aprender muito) são especialmente canalizadas para esse setor, comparativamente à sua economia real.

Como há um problema de informação, não vale o primeiro teorema do bem-estar e há espaço, sim, para considerações de ineficiência.

M disse...

Eu já tinha entendido que você tava falando de recém-formando inexperientes. Ainda assim eu discordo de vocë.

Especificamente falando de um dos seus argumentos (apesar de eu discordar de todos), analistas (mesmo os juniors) no mercado fin tem muito mais influencia na atividade da empresa (dos traders, por exemplo) do que um analista junior da, digamos, Brasil telecom. Então talvez faça sentido dar os bonus sim.

Theo disse...

Vale ponderar que o que o guilherme vem tentando argumentar nao vale para bancos, como um todo. Acho que vc quer dizer bancos de investimentos (IB) ou assets. Enfim, concordo com o Rafael e, ainda, acrescento mais um ponto: lembre-se que nesses locais a rotatividade é alta e o salário, em geral, nada excepcional (portanto a variância dos retorno é bem elevada). Se o cara não trouxer resultados no curto prazo, é cortado. Isso entra na conta, com certeza...