sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Exemplificando

Hoje li um excelente exemplo do comportamento que me incomoda na esquerda brasileira. Fernando Morais é um sujeito extrmamente culto. A biografia do Chateaubriand que ele escreveu é sensacional e totalmente imparcial. Ele é amigo do Lula e Castrista desde criança. Eu acho quase impossível que ele acredite na resposta que ele deu ao jornalista do Valor:

Valor: Como você consegue conviver com a falta de liberdade de imprensa em Cuba?

FM: Cuba é um país em guerra. Sofre embargo econômico e está sob ameaça permanente de invasão pelo mais poderoso complexo militar do mundo. O inimigo está ali, a 200 quilômetros. Todo país em guerra controla seus meios de comunicação.

É doublethink puro, saído diretamente de 1984.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Eterna Dúvida

Voltando ao eterno assunto PT vs PSDB, saiu uma nota do PT, assinada pelo Berzonini, onde lemos
"Torcemos para que o PSDB se encontre e produza um programa de governo, para que possamos ter um debate de alto nível neste ano eleitoral. O PT e seus aliados temos o que mostrar e propor aos brasileiros. Esperamos que a oposição não se esconda, nem se acovarde de defender a herança de FHC, da privatização, desemprego e paralisia nacional."
Eu tenho duas hipóteses. A primeira é que a cúpula do PT realmente acredita nisso. Nesse caso, os membros do partido seriam incapazes de enxergar que as reformas feitas no governo do Fernando Henrique foram essenciais para que esses últimos anos tenham sido de sucesso. Inclusive com a manutenção da política macroeonômica por parte do próprio PT (política que jamais seria implementada por iniciativa dos petistas).

A segunda é que a cúpula do PT não acredita nisso, mas sabe que muitas pessoas são ignorantes e vão acreditar em qualquer besteira. Nesse caso, os membros do partido teriam mais interesse no poder do que na honestidade. Pior ainda, tem mais interesse no poder do que no bem estar das pessoas. É exatamente a mesma estratégia do Collor, dizendo que o Lula confiscaria o dinheiro das pessoas.

Eu acho que as duas hipóteses são mais ou menos válidas. E eu sei que existem muitos petistas por aí. E eu acho que se o PSDB não tivesse esses mesmos dois defeitos (burrice extrema e sede cega por poder), esses petistas em um momento ou outro deixariam o PT de lado. Eu queria abrir o debate para fatos que me mostrem esses defeitos no PSDB.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Econobobos

Se os biólogos têm que aguentar os ecochatos, os economistas têm os econobobos. Uma das bobeiras que eles vivem repetindo é que os economistas padecem de uma inveja nefasta da física. O desenvolvimento de modelos formais teria como único objetivo fazer um corpo teórico comparável aos modelos da física, sendo inútil do ponto de vista científico e prático, afinal de contas as pessoas não podem ser tratadas como átomos, não é?

Pegando carona no post médico de uns dias atrás, se os econobobos conecessem economia mais recente, eles teriam que ampliar o escopo da inveja, incluindo a Medicina. São extremamente comuns hoje em dia papers de economia que seguem o padrão de estudos médicos. São apresentadas idéias baseadas em modelos conhecidos sobre algum evento de interesse, depois essas idéias são testadas através de experimentos estatísticos. A técnica estatística é variada entre as áreas, mas a maneira de pensar é semelhante.

Mesmo que um dia os econobobos percebam isso e inventem alguma historinha sobre a inutilidade dessa abordagem (afinal de contas, as pessoas não podem ser tratadas como células do fígado, não é?), acredito que a economia já terá mudado mais uma vez.

Se os economistas sérios tivessem interesse em assuntos desinteressantes como eu, acho que eles chegariam à conclusão de que, na verdade, os econobobos têm inveja da economia séria.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Uma contribuição para o debate sobre Doença holandesa

Em primeiro lugar, quero dizer que tenho acompanhado as críticas aos proponentes da hipótese de doença holandesa para o Brasil no Mão Visível e acredito que, até agora, aqueles que a defendem têm encontrado dificuldade em mostrar que ocorreu de fato desindustrialização.

Meu ponto é que essa discussão é, para dizer o mínimo, incompleta. Vejamos porque. Suponha uma economia na qual a indústria aumenta sistematicamente, num dado período, sua participação no produto. Suponha, contudo, que a despeito disso o dinamismo dessa indústria, medido pela tecnologia utilizada na sua produção, ou pela produtividade dos fatores empregados nesse setor, se mantém estagnado ou declina. Suponha ainda que o dinamismo desse setor em outras economias, em especial nos principais mercados com quem realiza trocas comerciais, assim como em seus principais concorrentes, aumentou sistematicamente no período.

Nesse cenário, a economia terminaria mais industrializada do que no início do período, mas com um setor bem menos dinâmico em termos relativos; por definição, mais distante da fronteira tecnológica e portanto em situação estruturalmente pior no que diz respeito a crescimento econômico, já que aqueles que defendem a hipótese de doença holandesa o definem como "aquisição de tecnologia" ou "structural upgrading".

Agora podemos parar com as hipóteses: a situação descrita acima conta a história da produtividade das manufaturas no Brasil desde 1980. Vejamos os gráficos abaixo:


Esse gráfico foi construído a partir de dados da GGDC para valor agregado na manufatura e emprego no setor. Mostra que após crescimento acelerado da produtividade da manufatura entre 1950 e 1980, temos uma um declínio e estagnação em termos absolutos a partir de então.

O próximo gráfico, usando a mesma base de dados, compara a produtividade da manufatura no Brasil e nos EUA para o mesmo período:


Esse gráfico impressiona não somente porque o gap de produtividade EUA-Brasil na manufatura, que manteve-se basicamente estável até os 1980, aumenta continuamente a partir de então, mas principalmente porque os EUA certamente não é a economia mais dinâmica nessa dimensão.

O gráfico abaixo, de natureza um pouco diferente (define como 100 o valor da produtividade na manufatura para o ano inicial para o qual havia dados, 1963), inclui a Coréia do Sul:


Note que mesmo considerando que o Brasil parte de uma base mais baixa (o que justifica que o gráfico vermelho esteja acima do azul no período inicial), o incremento da produtividade na manufatura é tão baixo a partir do período final que é superado pelos EUA. A intensidade do incremento na produtividade da manufatura na Coréia do Sul supera de longe qualquer das duas outras economias.

Conclusão: mais importante do que se a indústria aumentou ou diminuiu sua participação no PIB ao longo das últimas décadas, o fato é que esta perdeu dinamismo e o gap de produtividade em relação a outras economias desenvolvidas, ou em desenvolvimento consideradas casos de sucesso, aumentou sistematicamente a partir de 1980. Isto sim deveria preocupar os economistas que discordam de um modelo de crescimento baseado nas vantagens comparativas ricardianas.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Anything but policy

Hoje foi o primeiro dia do Second Latin American Advanced Programme on Rethinking Macro and Development Economics (LAPORDE).

A palestra com o Ha-Joon Chang voltou a mostrar que todos os principais países hoje desenvolvidos se utilizaram de protecionismo para desenvolver setores antes incipientes. A evidência empírica é concreta, e do ponto de vista teórico de fato não há incompatibilidade entre ineficiência estática e eficiência dinâmica (muito pelo contrário, aliás; esse trade-off está presente nos conceitos econômicos tão básicos quanto a maximização de lucros do monopolista, e é conhecido de forma mais geral como conjectura de Coase).

Claro que não é fácil escolher quais setores proteger, quando eliminar a proteção, etc. Mas não há motivo nenhum para acreditarmos que fazer política econômica deveria ser algo simples, ou que deveriámos deixar tudo o que é complexo para o mercado. Quando há externalidades (sobretudo quando falamos de efeitos dinâmicos sobre outros setores), intervenção governamental pode ser desejável.

Queria destacar um comentário do Ha-Joon que julgo bastante interessante. Ele chama a atitude do mainstream em relação a Desenvolvimento de 'Anything-but-Policy Economics' ("Se um país cresce mais que outro, a causa fundamental não podem ser políticas; afinal, porque o outro país não adota as políticas que levaram ao crescimento do outro?").

Para mim, a resposta a essa pergunta tem a ver com o fato de que 1) não é consensual quais sejam as melhores políticas a cada contexto, 2) mesmo quando o é, podem não ser adotadas por fatores institucionais, 3) mesmo quando são adotadas, implementação é uma arte.

Deveríamos entender mais sobre policy making...


domingo, 10 de janeiro de 2010

Está cada vez mais difícil acreditar na hipótese Serra-mentiroso.

A política macroeconômica estável foi o pilar que permitiu o desenvolvimento nos últimos 15 anos. Para ser mais específico o Brasil começou deslanchar quando estabeleceu como base da política monetária: câmbio flutuante, meta de inflação e superavit primário.

No entanto, ambos os candidatos a presidência da República parecem abominar o famigerado tripé. Surpreendentemente, o Serra mais do que a Dilma ataca a política monetária.

O que defensores de uma política macroecônomica responsável normalmente acreditam é que o Serra só reclama da valorização do câmbio e da taxa de juros da-boca-para-fora. E parecem se contentar com isso.

Para mim parece pouco. Das duas uma: ou temos um Serra-mentiroso, reiteradamente falando que vai mexer no câmbio e combater as taxas de juros elevadíssimas e não vai, ou temos um Serra-ignorante, incapaz de compreender e capitalizar os resultados da atuação de membros de seu partido.

Sinto informar aos partidários da hipótese do Serra-mentiroso, que está cada vez mais difícil acreditar na existência dele. Quando interpolado sobre a decisão da ministra Dilma de rechaçar as metas de desmatamento o governador gratuitamente mostrou sua habital ignorância econômica.

“Os juros siderais e o câmbio mega-hiper-valorizado são muito piores para o desenvolvimento do que qualquer medida de defesa do meio ambiente”

Agora foi a vez de um outro membro da "elite" tucana, o presidente do partido Sergio Guerra, em entrevista à Veja, mostrar que o Serra-ignorante está aí para valer. Sua autoridade disse:

"Iremos mexer na taxa de juros, no câmbio e nas metas de inflação. Essas variáveis continuarão a reger nossa economia, mas terão pesos diferentes. Nós não estamos de acordo com a taxa de juros que está aí, com o câmbio que está aí. Estamos criando empregos no exterior. Os últimos resultados da balança comercial são negativos. Precisamos estabelecer mecanismos para criar empregos no Brasil. Espero que a sociedade nos compreenda."

Está ficando difícil acreditar.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

A pergunta da Isaura

Semana passada lá estávamos minha patroa e eu assistindo um dos seriados médicos que acompanhamos (me recuso a dizer qual, mas não era Greys Anatomy) quando ela me perguntou se eu já tinha pensado alguma vez na vida em ser médico.

A minha resposta padrão é dizer não. Qualquer um que conheça minha desastrosa habilidade motora fina sabe que eu jamais deveria ter permissão de tocar em um bisturi. No entanto, refleti um pouco mais do que de costume e respondi: Já, agora!

Minha resposta vem de uma certa descrença que as vezes tenho na capacidade da pesquisa em economia de contribuir para o bem-estar da humanidade. Afinal, se que quero ser pesquisador queria ao menos ter certeza de que meu trabalho ajudará os outros.

Para elucidar o problema, consigo elaborar facilmente uma lista de grandes problemas da medicina:

-Como curar e previnir Aids
-Como curar o câncer.
-O que causa os males de Alzheimer e Parkinson e como curá-los.
-O que gera esquizofrenia.

E por ai vai. Elaborar essa lista em economia me parece bem mais difícil. Alguns amigos macroeconomistas me sugeriram problemas inspirados pela crise. Por exemplo, como prevenir depressões, como a política monetária deve levar em conta novos produtos financeiros.

Me parece pouco. Eu sinto que nós economistas somos os garotos chatos que sentam na frente na sala de aula. Ficamos muito bons em responder perguntas, mas as nossas perguntas não são tão boas.

Se alguém puder me ajudar com grandes problemas da ciência econômica que eu não esteja levando em conta, eu agradeço. Creio que a Isaura não vai me tolerar por mais 6 anos de faculdade de medicina e 2 de residência até que eu comece a botar algum pão em casa.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Dividendo Mínimo Obrigatório: custos de eficiência vs proteção de acionistas minoritários

Seguindo a linha do Guilherme, segue um link para minha tese (basta clicar em Download e esperar 10 segundos...). Aguardo comentários/sugestões!

LINK PARA TESE

Abaixo o abstract:

Uma vasta literatura em finanças corporativas afirma que o Brasil, assim como os demais países com leis de origem francesa, oferece baixa proteção aos acionistas. Surpreendentemente, não há em tal literatura nenhum artigo que analise a eficácia do dividendo mínimo obrigatório, instrumento este que pode ser considerado um substituto à fraca legislação. O objetivo do presente artigo é suprir, pelo menos em parte, esta lacuna.
Ainda que existam subterfúgios ao não cumprimento do dividendo mínimo, as evidências empíricas apontam para alguma eficácia da legislação, isto é, alta distribuição de dividendos. Por outro lado, pode ser o caso em que a não distribuição de ganhos seja uma estratégia eficiente, por exemplo, em uma empresa com bons projetos à disposição. Nesse caso, o dividendo mínimo obrigatório implicaria em um custo de eficiência à política de investimentos da firma.
Faremos dois estudos sobre a distribuição de lucros. O primeiro consistirá em uma comparação do investimento em empresas que pagam e não pagam dividendos, antes e depois da crise de 2008. O resultado encontrado é que investimentos (ou a não distribuição de dividendos) parecem ser parcialmente explicados pela expropriação dos minoritários. O segundo estudo verificará a relação entre o acúmulo de reservas de lucros e a existência de bons projetos. Corroborando o resultado anterior, encontramos evidência de que a retenção de lucros nem sempre é justificada por melhores oportunidades de investimentos.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Operação da justiça e Desenvolvimento

Vou inaugurar uma linha sugerida há algum tempo, em que cada um de nós publica aqui um resumo da dissertação. Pesquiso o efeito da operação de cortes judiciais sobre empreendedorismo e investimento.

Emergiu recentemente na literatura econômica um consenso de que instituições são relevantes para explicar diferenças de renda per capita entre os países, mas ainda são pouco claros os mecanismos através dos quais essas 'regras do jogo' deveriam afetar decisões econômicas. Desenvolvo um modelo em que indivíduos escolhem sua ocupação contingente à operação das cortes numa economia. Cortes afetam a decisão ocupacional ao condicionar os estados da natureza sob os quais um contrato junto a um fornecedor de capital é observado, de modo que o retorno esperado de empreender em equilíbrio é função das dimensões de operação da justiça.

De outro lado, isso também determina o colateral ótimo exigido pelos fornecedores em equilíbrio, determinando que indivíduos são capazes de tornar-se empreendedores com base em sua riqueza inicial. Por fim, o empreendedor pode realizar um investimento específico para aumentar o valor de seu projeto independentemente do estado da natureza que emerge ex-post; esse investimento é função da medida dos estados da natureza sob os quais o contrato é observado e, pois, seu retorno apropriado pelo empreendedor.

Quatro resultados são de interesse:

(1) Custos para iniciar um negócio (startup costs / upfront payments) só são economicamente justificados quando há incompletudes contratuais em contextos nos quais o fornecedor pode ser expropriado de sua opção de fora;

(2) Quando o empreendedor pode expropriar o fornecedor nos estados da natureza sob os quais o contrato não é observado, incrementos marginais na observabilidade do contrato não necessariamente aumentam empreendedorismo, e não afetam investimento;

(3) Quando o empreendedor não pode expropriar o fornecedor nos estados da natureza sob os quais o contrato não é observado, aumentos marginais na observabilidade do contrato não afetam empreendedorismo, e aumentam investimento;

(4) Empreendedorismo e investimento decrescem com custos de acesso à justiça (custos de litígio).

Intuição de (1): o fornecedor somente exigirá colateral para o empreendedor marginal quando for inviável que este possa compensar aquele através de pagamentos ex-post pela expropriação sofrida nos estados sob os quais o contrato não é observado. Esse resultado é interessante porque mostra que a ineficiência tradicionalmente enfatizada pela literatura de escolha ocupacional e desenvolvimento (i) é na verdade função da estrutura contratual da economia, (ii) é um caso particular, mais do que caso geral dessa configuração contratual; e (iii) é apenas uma dentre outras fontes de ineficiência que não necessariamente aparecem através da estrutura ocupacional - basta ver que quando não existem cortes, mas o fornecedor tem todo o poder de barganha ex-post, não haverá exigências de colateral (pois o fornecedor não pode ser expropriado), mas o investimento específico será zero (pois o empreendedor, de outro lado, pode ser plenamente expropriado do retorno de seu investimento).

Intuição de (2): Há dois efeitos de aumentar a observabilidade do contrato sobre o empreendedor marginal. De um lado, como o fornecedor recebe pagamentos ex-post em mais estados da natureza, seria possível induzir sua participação através de um colateral menor; de outro lado, prover pagamentos ex-post agora é mais caro para o empreendedor, pois eles se realizam em expectativa em um subconjunto maior de estados. O efeito final não é claro. O investimento não é afetado porque sempre é máximo: o empreendedor expropria, logo não pode ser expropriado.


Intuição de (3): Dado que o fornecedor não pode ser expropriado, não há exigências de colateral, logo a proporção de empreendedores não é afetada marginalmente pelas cortes. Já o investimento é, uma vez que o empreendedor pode ser expropriado ex-post, e logo investirá tanto mais quanto maior a observabilidade do contrato.

Intuição de (4): Custos de litígio tornam mais difícil induzir a participação do fornecedor para um dado menu de pagamentos, além de diminuir a disposição do empreendedor de utilizar pagamentos ex-post, pois utilizar o contrato - e, pois, a tecnologia de cortes - agora é mais caro. Logo, o efeito não é ambíguo e as exigências de colateral aumentam com esses custos, reduzindo empreendedorismo. Esses custos podem crescer a ponto de desincentivar o uso da tecnologia de arbitragem das cortes, substituída por renegociação entre as partes, o que reduz investimento quando o empreendedor pode ser expropriado nos estados em que não vale o contrato.

Os resultados de (4) são então levados aos dados utilizando a experiência de redução de custos de acesso à justiça dada pelo surgimento dos Tribunais de Pequenas Causas no Brasil a partir de 1985 e posterior conversão em Juizados Especiais Cíveis, a partir de 1996 - que possuem especificamente uma câmara de negócios. Mais detalhes sobre os resultados empíricos num próximo post...

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Preços nos EUA OU câmbio no Brasil?

Para quem não conhece, John Williams' Shadow Government Statistics apresenta versões alternativas de cálculos oficiais para vários indicadores econômicos, de inflação a desemprego, em contraposição àqueles divulgados pelo Governo dos EUA - que, segundo John Williams, seriam manipulados, contaminados pelo "financial-market and political hype".

John Williams tem também suas opiniões sobre as políticas de reativação da economia norte-americana. Segundo uma nota recente (veja aqui), Williams aponta para uma hiperinflação inescapável, entre 2010 e 2018, com "riscos particularmente altos de que uma crise hiperinflacionária estoure já em meados do próximo ano".

Seu argumento é de que imprimir dinheiro é a única maneira disponível para que o Governo dos EUA possa arcar com as obrigações financeiras crescentes, cujo montante é alto o suficiente para que seja impraticável fazer frente a elas através de aumento de impostos, e diante da impossibilidade de um corte de gastos, algo que considera "intocável" no atual contexto. Adicionalmente, o dólar desvalorizado é uma força adicional no sentido de perda de poder de compra do consumidor americano.

Para mim, é justamente esse último ponto que escapa a Williams. Para arcar com compromissos cada vez maiores, os EUA precisam gerar recursos. Isso significa imprimir mais moeda ou inverter radicalmente o panorama recente do balanço norte-americano em transações correntes e passar a exportar radicalmente mais. A "desvalorização concertada" que vem ocorrendo lembra exatamente o arranjo do acordo de Plaza, de 1985, a partir do qual o dólar se desvalorizou e que permitiu uma re-ignição à economia norte-americana.

Nesse contexto, o que há de diferente é que os chineses não querem assumir os custos do ajuste como fizeram os japoneses, então vistos como "a nova primeira potência mundial". Inclusive, em reportagem recente no Valor, os chineses reconhem através de uma série de declarações oficiais que a valorização do yen à época empurrou a economia japonesa para a recessão na qual se encontra até hoje, em alguma medida.

Não está claro até que ponto a UE, e a Alemanha, em especial, serão capazes de evitar ao menos parcialmente esse ajuste. O que é certo é que o Brasil, apesar de uma ou outra tentativa de valorização controlada, será parte integrante desse ajuste estrutural, e a pressão de valorização (que hoje já alcançou a marca de 25% no ano) deve seguir bastante firme até que os EUA comecem a dar sinais de recuperação, impulsionados pelo setor externo.