O mercado nacional de cinema é algo que tem me interessado muito nos últimos 18 meses, em particular em virtude de suas transformações ao longo do tempo. Como pouquíssima gente já refletiu sobre o setor com um olhar econômico, há muita coisa a ser explorada em pouco espaço, então hoje vou focar na organização industrial do setor. Se o post emplacar volto a falar no tema.
Na maioria das economias desenvolvidas, o setor é caracterizado pela integração vertical das etapas da cadeia produtiva: distribuidor e exibidor fazem parte de um mesmo conglomerado. A lógica econômica por detrás dessa organização remente à continuidade natural dessas atividades: (i) os retornos de uma distribuição onerosa aparecem na forma de maiores receitas para o parque exibidor, (ii) o exibidor, de outro lado, condiciona a extensão do retorno possível para as atividades acima na cadeia, ao controlar o tempo em cartaz, exibição de trailers e outras estréias.
No Brasil, essa lógica prevaleceu até início da década de 1990, o que esteve associada a forte desempenho do cinema nacional, impulsionado também pela atividade organizadora da EMBRAFILME. Com a abertura comercial, grandes distribuidoras (as majors) adentraram o mercado nacional em especial em função das modificações sofridas pelo parque exibidor, em que se estabeleceu um novo modelo de negócio: salas em shoppings, em detrimento de salas de rua, e sobretudo os complexos multiplex, nos quais uma única cópia pode ser exibida em mais de uma sala.
O novo modelo chacoalhou o setor, e distribuição e exibição passaram a constituir atividades separadas. A relação de barganha sobre os retornos gerados pela intensa complementariedade das atividades estabeleceu-se com grande desequilíbrio, em favor das distribuidoras. Nesse sentido, todo o retorno de um filme primeiro é direcionado para remunerar sua distribuição. Isso fez com que a lucratividade da exibição fosse extremamente reduzida, com impactos diversos: (i) apenas 7% dos municípios brasileiros possui sala de cinema, e são raros os municípios com menos de 100 mil habitantes que possuem alguma oferta de salas; (ii) a partir de 2002, com a mudança de estratégia de despesas de lançamento (cerca de 40 cópias por filme até então, para uma média próxima de 15o cópias por filme) - adicionalmente a toda uma nova estratégia de comercialização das majors, focando nos blockbusters e sequências e progressivamente eliminando a produção residual - a produção nacional não conseguiu acompanhar a internacional exibida aqui em termos de cópias no lançamento, pois a distribuição tornou-se tão cara que seria virtualmente impossível recuperar os custos totais de um filme.
A política de valorização da cultura e apoio ao cinema nacional, sobretudo expressa na determinação de cotas de tela, é mal desenhada e pouco amparada em dados, transferindo cota de complexos menores para médios (ou vice-versa) conforme o cinema nacional vai mal (ou bem) no ano anterior. Uma política de fomento à criação de novas salas pareceria a mais adequada a aumentar o público do cinema nacional, pois o problema de restrição de oferta é evidente, não só pela escassez de municípios com tela, mas também porque o Brasil tem uma das relações mais inadequadas em termos de habitantes por sala (o considerado ideal é de 40.000, apenas DF apresenta relação inferior)... mas como fazer isso se o negócio não é lucrativo?
Diante disso, a digitalização das salas aparece como a política mais promissora, pois reduz de maneira substancial os custos de exibição, tornando possível que uma sala no interior do Nordeste exiba um blockbuster no mesmo momento em que ele foi lançado numa capital. Isto não apenas redistribuiria poder de barganha entre distribuidores e exibidores, mas tornaria lucrativo o negócio exibidor, permitindo sua expansão e também incremento da competição (ainda que algo pulverizado, o líder do setor - a rede Cinemark - possui 3 vezes a participação da segunda empresa de maior market share).
Na maioria das economias desenvolvidas, o setor é caracterizado pela integração vertical das etapas da cadeia produtiva: distribuidor e exibidor fazem parte de um mesmo conglomerado. A lógica econômica por detrás dessa organização remente à continuidade natural dessas atividades: (i) os retornos de uma distribuição onerosa aparecem na forma de maiores receitas para o parque exibidor, (ii) o exibidor, de outro lado, condiciona a extensão do retorno possível para as atividades acima na cadeia, ao controlar o tempo em cartaz, exibição de trailers e outras estréias.
No Brasil, essa lógica prevaleceu até início da década de 1990, o que esteve associada a forte desempenho do cinema nacional, impulsionado também pela atividade organizadora da EMBRAFILME. Com a abertura comercial, grandes distribuidoras (as majors) adentraram o mercado nacional em especial em função das modificações sofridas pelo parque exibidor, em que se estabeleceu um novo modelo de negócio: salas em shoppings, em detrimento de salas de rua, e sobretudo os complexos multiplex, nos quais uma única cópia pode ser exibida em mais de uma sala.
O novo modelo chacoalhou o setor, e distribuição e exibição passaram a constituir atividades separadas. A relação de barganha sobre os retornos gerados pela intensa complementariedade das atividades estabeleceu-se com grande desequilíbrio, em favor das distribuidoras. Nesse sentido, todo o retorno de um filme primeiro é direcionado para remunerar sua distribuição. Isso fez com que a lucratividade da exibição fosse extremamente reduzida, com impactos diversos: (i) apenas 7% dos municípios brasileiros possui sala de cinema, e são raros os municípios com menos de 100 mil habitantes que possuem alguma oferta de salas; (ii) a partir de 2002, com a mudança de estratégia de despesas de lançamento (cerca de 40 cópias por filme até então, para uma média próxima de 15o cópias por filme) - adicionalmente a toda uma nova estratégia de comercialização das majors, focando nos blockbusters e sequências e progressivamente eliminando a produção residual - a produção nacional não conseguiu acompanhar a internacional exibida aqui em termos de cópias no lançamento, pois a distribuição tornou-se tão cara que seria virtualmente impossível recuperar os custos totais de um filme.
A política de valorização da cultura e apoio ao cinema nacional, sobretudo expressa na determinação de cotas de tela, é mal desenhada e pouco amparada em dados, transferindo cota de complexos menores para médios (ou vice-versa) conforme o cinema nacional vai mal (ou bem) no ano anterior. Uma política de fomento à criação de novas salas pareceria a mais adequada a aumentar o público do cinema nacional, pois o problema de restrição de oferta é evidente, não só pela escassez de municípios com tela, mas também porque o Brasil tem uma das relações mais inadequadas em termos de habitantes por sala (o considerado ideal é de 40.000, apenas DF apresenta relação inferior)... mas como fazer isso se o negócio não é lucrativo?
Diante disso, a digitalização das salas aparece como a política mais promissora, pois reduz de maneira substancial os custos de exibição, tornando possível que uma sala no interior do Nordeste exiba um blockbuster no mesmo momento em que ele foi lançado numa capital. Isto não apenas redistribuiria poder de barganha entre distribuidores e exibidores, mas tornaria lucrativo o negócio exibidor, permitindo sua expansão e também incremento da competição (ainda que algo pulverizado, o líder do setor - a rede Cinemark - possui 3 vezes a participação da segunda empresa de maior market share).
6 comentários:
Olá,
Parabéns por manter o blog.
Eu conheço o Fabio Sá Earp que dá aulas sobre Economia do Entretenimento na UFRJ, segue link para um estudo sobre o cinema que pode interessar:
http://www.ie.ufrj.br/publicacoes/discussao/TD08_09_25_Fabio_Sa_Earp.pdf
Obrigado, conhecia esses dois estudos do Fabio, descrevendo o setor de forma estilizada.
Tenho três estudos econométricos que trazem análises mais finas do comportamento de firmas e consumidores nesse mercado: cálculo de elasticidades-preço e -renda da demanda, cálculo de concentração e impacto de cópias no lançamento sobre desempenho, e perfil sócio-econômico do consumidor.
Aos poucos vou postando no blog para aprofundarmos a discussão, se for de interesse.
Pode colocar o link, se tiver, por favor.
Valeu
Sobre a estrutura competitiva da distribuição e impacto econômico das despesas de lançamento:
http://rapidshare.com/files/261395143/Relat_rio_2_revisto.pdf.html
Sobre o perfil do consumidor de cinema:
http://rapidshare.com/files/261395378/Relat_rio_fase_3_revisto.pdf.html
Muito bom o artigo e dados sobre o setor, estou fazendo o Tcc do Espaço Unibanco de Cinema, vocês poderiam me ajudar com dados de market share do setor de distribuidoras de cinema.
Gostaria de ter acesso as pesquisas mencionadas no blog pelos comentaristas; o conteúdo está vazio. Informações de mercado e público são raras para o setor, e plano de negócios então nem se fala. Alguém pode indicar material para executar um planejamento estratégico para cinema?
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