quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Lobo mau e os 3 porquinhos

Conheço essa versão de Os Três Porquinhos narrado por um pai Engenheiro - e, não economista, como julgam alguns, mas até que acaba mesmo parecido!! ahaahah... Lê aí (copyleft):

Meu Filho, era uma vez três porquinhos ( P1, P2 e P3 ) e um Lobo Mau, por definição, LM, que vivia os atormentando.

P1 era sabido e fazia Engenharia Elétrica e já era formado em Engenharia Civil.

P2 era arquiteto e vivia em fúteis devaneios estéticos absolutamente desprovidos de cálculos rigorosos.

P3 fazia Comunicação e Expressão Visual na ECA.

LM, na Escala Oficial da ABNT, para medição da Maldade ( EOMM) era Mau nível 8,75 (arredondando a partir da 3ª casa decimal para cima ). LM também era um mega investidor imobiliário sem escrúpulos e cobiçava a propriedade que pertencia aos Pn ( onde "n" é um número natural e varia entre 1 e 3 ), visto que o terreno era de boa conformidade geológica e configuração topográfica, localizado próximo a Granja Viana.

Mas nesse promissor perímetro P1 construiu uma casa de tijolos, sensata e logicamente planejada, toda protegida e com mecanismos automáticos.

Já P2 montou uma casa de blocos articulados feitos de mogno que mais parecia um castelo lego tresloucado.

Enquanto P3 planejou no Autocad e montou ele mesmo, com barbantes e isopor como fundamentos, uma cabana de palha com teto solar, e achava aquilo "o máximo".

Um dia, LM foi ate a propriedade dos suínos e disse, encontrando P3:- "Uahahhahaha, corra, P3, porque vou gritar, e vou gritar e chamar o Conselho de Engenharia Civil para denunciar sua casa de palha projetada por um formando em Comunicação e Expressão Visual! "

Ao que P3 correu para sua amada cabana, mas quando chegou lá os fiscais do Conselho já haviam posto tudo abaixo. Então P3 correu para a casa de P2.

Mas quando chegou lá, encontrou LM à porta, batendo com força e gritando:- "Abra essa porta, P2, ou vou gritar, gritar e gritar e chamar o Greenpeace, para denunciar que você usou madeira nobre de áreas não-reflorestadas e areia de praia para misturar no cimento."

Antes que P2 alcançasse a porta, esta foi posta a baixo por uma multidão ensandecida de ecos-chatos que invadiram o ambiente, vandalizaram tudo e ocuparam os destroços, pixando e entoando palavras de ordem.

Ao que segue P3 e P2 correm para a casa de P1.Quando chegaram na casa de P1, este os recebe, e os dois caem ofegantes na sala de entrada.

P1: O que houve?

P2: LM, lobo mau por definição, nível 8.75, destruiu nossas casas e desapropriou os terrenos.

P3: Não temos para onde ir. E agora, que eu farei? Sou apenas um formando em Comunicação e Expressão Visual!

Tum-tum-tum-tum-tuuummm!!!! (isto é somente uma simulação de batidas à porta, meu filho! o som correto não é esse).

LM: P1, abra essa porta e assine este contrato de transferência de posse de imóvel, ou eu vou gritar e gritar e chamar os fiscais do Conselho de Engenharia em cima de você!!!, e se for preciso até aquele tal de Confea

Como P1 não abria (apesar da insistência covarde do porco arquiteto e do...do... comunicador e expressivo visua?) LM chamou os fiscais, e estes fizeram testes de robustez do projeto, inspeções sanitárias, projeções geomorfológicas, exames de agentes físico-estressores, cálculos com muitas integrais, matrizes, e geometria analítica avançada, e nada acharam de errado. Então LM gritou e gritou pela segunda vez, e veio o Greenpeace, mas todo o projeto e implementação da casa de P1 era ecologicamente correta.

Cansado e esbaforido, o vilão lupino resolveu agir de forma irracional (porém super-comum nos contos de fada): ele pessoalmente escalou a casa de P1 pela parede, subiu ate a chaminé e resolveu entrar por esta, para invadir.

Mas quando ele pulou para dentro da chaminé, um dispositivo mecatrônico instalado por P1 captou sua presença por um sensor térmico e ativou uma catapulta que impulsionou com uma força de 33.300 N ( Newtons ) LM para cima.

Este subiu aos céus, numa trajetória parabólica estreita, alcançando o ápice, onde sua velocidade chegou a zero, a 200 metros do chão.

Agora, meu filho, antes que você pegue num repousar gostoso e o Papai te cubra com este edredom macio e quente, admitindo que a gravidade vale 9,8 m/s² e que um lobo adulto médio pese 60 kg, calcule:

a) o deslocamento no eixo "x", tomando como referencial a chaminé

b) a velocidade de queda de LM quando este tocou o chão e

c) o susto que o Lobo Mau tomou, num gráfico lógico que varia do 0 ( repouso ) ao 9 (ataque histérico)

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

O Maldito Pré-Sal

Essa descoberta nova da Petrobrás tem sido uma grande oportunidade de se ver como funciona a cabeça dos brasileiros.

Começando pela forma como foi "anunciada". Um diretor da ANP, Haroldo Lima, durante um seminário na FGV, deu com a língua nos dentes (link). Ao divulgar um fato relevante sobre uma empresa listada em bolsa desta forma, o Haroldo coloca todas as pessoas que não estavam presentes no seminário em total desvantagem frente aos presentes. Como funciona a cabeça do brasileiro? O brasileiro despreza a economia de mercado e não se julga responsável pelo seus atos. Quando procurado posteriormente para dar explicações, Haroldo disse que não é subordinado à CVM (ok, o fernandinho beira-mar não é subordinado à polícia federal...). Também disse que o problema é da bolsa de valores, que ele nem sabe onde fica (link).

Depois disso começou a ladainha do petróleo é nosso (link). Nós? Quem é "nós"? O petróleo é de quem for dono da empresa que tiver o direito de explorá-lo. Como funciona a cabeça do brasileiro? O brasileiro preenche o seu fracasso com o sucesso do outro. Tudo bem o seu José ser um f***do na vida, mas o petróleo é dele!!

Agora vem o pior. De uns 10 dias para cá começaram a surgir notícias e mais notícias do tipo "Ministro fulando quer dinheiro do pré-sal para a saúde", "Lula quer dinheiro do pré-sal para combater a miséria"(link, link, link, link...). Como é que o brasileiro pensa? Vou ter que dividir a resposta em duas.

Primeiro, brasileiro é burro. Que dinheiro?! Petróleo só vale dinheiro entregue no endereço do comprador. Enquanto estiver lá a 7000 metros de profundidade, não vale 1 centavo. E para explorá-lo é necessário investimento e tempo. Não adianta querer repartir o butim agora se não se sabe ainda se haverá butim e, se houver, só chegará em um ou dois anos.

Segundo, brasileiro é preguiçoso e mau-caráter. Acha correto receber dinheiro sem trabalhar e gastar o dinheiro dos outros. Basta surgir uma oportunidade.

Ps.: antes que comecem a falar nos comentários que nem todo brasileiro é assim, que toda generalização é burra, etc, etc, eu sei disso tudo. Mas ainda assim, para mim, esse é o retrato do brasileiro.

Update: Mais um link espetacular para a sessão "quero meus 15%" para o deleite do leitor; link. (sugestão do Theo).

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Ortodoxia e heterodoxia

O meu primeiro post será sobre o artigo de T. Lawson, The nature of heterodox economics, publicado no Cambridge Journal of Economics 2006, 30, p.483-505.

O autor começa o artigo interpretando a heterodoxia como uma oposição à ortodoxia e investiga a essência do mainstream. Inicialmente, ele apresenta duas interpretações para a ortodoxia:

A primeira apresenta três elementos chaves aos trabalhos ortodoxos: “one component of most common strategy is everywhere to stipulate that human beings are rational (meaning optimizing) atomistic individuals. A second is the construction of theoretical set-ups or models specified to ensure that (typically unique) optimal outcomes are attainable.” E o terceiro surge como necessidade: “If the claim is that mainstream economics seek to defend the economic system per se, something more is required to guarantee this result. This, it is usually supposed, is achieved by the commonplace construction of an equilibrium framework […]”.

A segunda seria: “An obvious alternative hypothesis […] is that, if there is anything essential to the mainstream tradition of modern economics, it is merely a commitment to individualism, coupled with the axiom that individuals are everywhere rational (optimizing) in their behavior”

Logo depois, o autor questiona a veracidade dessas interpretações/definições de forma crítica comentando a existência de trabalhos ortodoxos mais modernos que descartam algumas das hipóteses/resultados usados nas abordagens acima.

Na verdade, a idéia central do autor sobre a ortodoxia é: “I believe there is a feature of modern mainstream economics that is essential to it. And it is an aspect so taken for granted that it goes largely unquestioned. This is just the formalistic-deductive framework that mainstream economists everywhere adopt, and indeed insist upon.[…] The truth is that modern mainstream economics is just the reliance on certain forms of mathematical (deductivist) method. This is an enduring feature of that project, and seemingly the only one; for the mainstream tradition it is its unquestioned, and seemingly unquestionable, essential core”.

Ou seja, para Lawson, o que identifica a ortodoxia é a unicidade no método, o uso de um raciocínio matemático-dedutivo. A partir disso, ele esclarece a natureza da heterodoxia:

“What follows for our understanding of heterodox economics? If the latter is first and foremost a rejection of modern mainstream economics, and the latter consists in the insistence that forms of mathematical–deductive method should everywhere be utilized, then heterodox economics, in the first instance, is just a rejection of this emphasis.

Notice that this does not amount to a rejection of all mathematical–deductive modeling. But it is a rejection of the insistence that we all always and everywhere use it. In other words, heterodox economics, in the first instance, is a rejection of a very specific form of methodological reductionism. It is a rejection of the view that formalistic methods are everywhere and always appropriate.

To say more about the nature of the heterodox traditions of modern economics, I think it is clear that we need to explain this opposition. And, as noted, we are concerned here with explaining an opposition that is sustained and enduring.

One conceivable explanation, I suppose, is that heterodox economists believe that methodological pluralism is desirable per se and no more needs to be said. But is that really all there is to it? After all, in some fields of physics, such as super string theory, mathematical methods seem actually to be universally applied, but without any sign of a heterodox opposition. In economics, by contrast, there clearly is a heterodox opposition to the mainstream. And the phenomenon to explain is not just that a heterodox opposition exists, but that it is, as noted, relatively widespread, firm, often highly vocal and enduring.”

Lawson afirma que a diferença entre ortodoxos e heterodoxos reside no método, no questionamento de um método único.

Eu recomendo a leitura do texto. O que eu tentei fazer nesse post é ilustrar um pouco o texto dele, tipo uma propaganda. Claro que o texto vai além do exposto, mas procurei me ater ao debate do último post, Bresser e o ovo do Dragão (ou melhor, dos comentários...).

O que vocês acham da visão de ortodoxia apresentada?

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Bresser e o ovo do dragão

Luis Carlos Bresser Pereira ocupou o ministério da fazenda por um período de tempo durante o governo Sarney e falhou em combater a inflação. Muitos consideram que não foi capaz de fazê-lo por causa do arcabouço político desfavorável. Entretanto, no artigo publicado ontem no Valor, ele mostra que em sua teoria, inflação é uma condição para o crescimento.

Depois de passar parágrafos, descrevendo (mal e recheado de ironias) como os ortodoxos explicam a variação na conta corrente, ele resolveu expôr o seu ponto.

"Nossa visão é oposta. Ainda que haja um componente institucional e cultural determinação da poupança interna, esta é determinada no curto prazo pela taxa de câmbio. Quando esta se deprecia, como aconteceu em 2002, a taxa real de salários diminui, o consumo cai, e a poupança interna aumenta. Foi exatamente o que aconteceu com o Brasil em 2003. Em seguida, com a nova e gradual apreciação do câmbio, os salários e o consumo aumentam e a poupança volta a cair, como vemos no gráfico. Como além disso, o ritmo do crescimento das exportações cai e, com uma defasagem, aumentam as importações, o país entra em regime de défict em conta corrente e de novo ciclo de fragilização interna. ... De acordo com esse raciocícnio é a taxa de câmbio que determina a poupança e não o contrário."

Bresser não consegue separar claramente o que são variáveis exógenas e endógenas. Atualmente vivemos em um modelo de câmbio flexível e, portanto, sua cotação é uma variável endógena. Nem que o BC quisesse ele conseguiria desvalorizar o câmbio.

Bresser precisa ser mais claro em sua posição. Se o que ele sugere é que mudemos para um câmbio fixo ou mixto, ele deveria dizê-lo. A outra aleternativa é que ele sugere que o BC baixe a taxa de juros para que capital saia e o câmbio se desvalorize, mas segundo ele mesmo, assim não sairíamos desse ciclo. Não deixar claro suas sugestões é uma desonestidade com o leitor.

Correndo o risco de me passar por cartomante, o que ele provavelmente sugere é uma mistura de ambas as alternativas. As consequências perniciosas da adoção de tal tese, ele mesmo descreve: redução dos salários reais (através do aumento da inflação) e redução no consumo, para assim aumentar a poupança e o investimento. Traduzindo é a velha tese de deixar o bolo crescer para depois dividir. Os trabalhadores subsidiando o investimento dos empresários, tese que levou o Brasil à hiperinflação e a ter uma das maiores desigualdades do mundo.

Mais alguns parágrafos e ele conclui:
"Na verdade, o grande desafio da política macroeconômica em um país em desenvolvimente é o de neutralizar a sobreapreciação cambial. Mas não é isso que ensina a ortodoxia convencional vinda do Norte. Para os países ricos, não há nada melhor do que uma taxa de câmbio sobreapreciada nos seus concorrentes do Sul. Os interesses nacionais são claros. E a teoria econômica ainda mais clara."

Todo ortodoxo tem alguma crença heterodoxa. O mainstream precisa das críticas para avançar. No entanto, heterodoxos no Brasil raramente possuem pontos que acrescentam algo a teoria econômica. A maioria é desatualizada, não tem base matemática, desconhece técnicas para testar teorias e precisa se basear quase exclusivamente na retórica para defender seus pontos. Alguns, como Bresser no parágrafo acima, chegam ao extremo de usar argumentos microfascistas para excluir respostas advindas de livros vindos do norte.
-Não os leiam, a teoria econômica é clara, e eu parecerei antiquado.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

NUNCA!!!



Eu quero entender qual foi a felicidade dele quando perdeu o dedo no torno...

Crise Mundial!!!

E aí vai um link para uma das coisas mais retardadas que eu li nos últimos tempos:

http://diplo.uol.com.br/2008-08,a2516

Essa pérola só foi digna de ser linkada porque o tal Ignácio Ramonet é diretor-presidente do Le Monde Diplomatique (desde 1991!!!), o que alimenta saborosamente o meu preconceito contra os franceses.

Ainda bem que a internet é cheia de textos de qualidade, porque se dependesse de mim pra escrever um post inteiro no blog sem ninguém para criticar, o Espectro ia viver às moscas.

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Simples ou complicado?

No meu post de estréia no Espectro Econômico, quero compartilhar com o amigo leitor uma pequena predileção: os argumentos que parecem estupidamente simples - seja porque evidentes ou, ao contrário, ridículos, impossíveis! -, mas que exigem um esforço enorme para serem justificados ou desarticulados, e que muitas vezes, na sua simplicidade, estão associados a implicações de política econômica de dimensões monumentais.

É o caso da Lei de Say, que só cito aqui em caráter ilustrativo. Nos tempos de graduação, alguns colegas resolveram reunir-se semanalmente para ler e discutir um pouco da História do pensamento econômico, em especial o contexto - político, econômico e, sobretudo, das idéias - no qual surgiram algumas obras seminais. Passando por Malthus, Ricardo e Mill, ficou clara a necessidade de estudar a Lei de Say com mais cuidado. "Toda a oferta gera sua própria demanda", afirma Say num 'Tratado sobre os mercados' de pouquíssimas páginas, a maior parte delas criticando as tropas de Napoleão que atiravam ao mar a produção que julgavam excessiva, que tolos! Ignoravam que toda a oferta, ao empregar os meios de produção, gera renda exatamente suficiente para que toda a produção seja vendida.

Um argumento simples, e imediatamente descartável diante das evidências da Crise de 1929, mas que exigiu 6 meses de leitura para que fosse possível entender com clareza qual princípio estava ausente no raciocínio lógico de Say... o leitor pode pensar que isso se deveu às limitações intelectuais do que vos fala, do que não discordaria, a não ser pelo fato de que grandes mentes como Schumpeter , Ricardo, Malthus e Mill dedicaram capítulos de suas obras a debater se o princípio era válido, sem limitar-se a uma economica de trocas.

Por fim, concluímos que a possibilidade de entesouramento, isto é, guardar dinheiro debaixo do colchão, é que tornava o princípio inválido. Do contrário, poupança e investimento são tão somente consumo diferido no tempo, e toda oferta gera sua própria demanda. Essa conclusão simples significa que, diante da possibilidade de entesouramento, o equilíbrio entre oferta e demanda não mais é garantido pelas forças de mercado. Em seus pronunciamentos na rádio, era frequente ouvir Keynes conclamar às senhoras que gastassem o dinheiro que mantinham nas gavetas diante da queda dos preços generalizada.

Essa introdução - mais longa do que eu gostaria - serve para que eu deixe aqui um argumento simples como alimento para o pensamento do leitor, restando o desafio de justificá-lo ou descartá-lo com base no raciocínio de um economista. O livro 'Mais sexo é sexo mais seguro', de Steven Landsburg, sucesso absoluto de venda nos Estados Unidos e tido como o novo Freakonomics, traz em um de seus primeiros capítulos um argumento curioso: um avarento é melhor para a sociedade do que um filantropo, uma vez que o primeiro, ao gastar menos, influencia os preços relativos, ou a taxa de juros, até que haja demanda para o excedente.

Segue um trecho: "Coloque um dólar no banco e baixará as taxas de juros apenas o suficiente para que alguém em algum lugar possa gastar esse dólar em férias ou na reforma da casa. Coloque a mesma quantia debaixo do colchão e (reduzindo efetivamente o suprimento monetário) estará baixando os preços o bastante para que alguém possa tomar um café a um dólar após o jantar."

Landsburg argumenta que o avarento, ao não gastar, gera uma externalidade via sistema de preços sobre toda a sociedade, aumentando o bem-estar de todos os demais. Se seu ponto aparentemente simples se sustenta, algo bastante mais relevante vem à tona, uma vez que o Estado, visto como sistema jurídico que regulamenta uma dada sociedade, tem como função básica produzir normas que permitam internalizar as externalidades fruto da interação social (sejam de ordem econômica ou não).

Você, o que acha?

Bolsa Professor Nicola de Matemática para Elio Gaspari

Elio Gaspari é um dos mais respeitados jornalistas brasileiros. Herdou os arquivos do Geisel e com eles realizou um bom trabalho de historiador e uma bela coleção de livros sobre o período militar. Entretanto, no artigo "Por qué não te callas, Meirelles", publicado nos jornais de ontem, perdeu uma boa oportunidade de esconder que entende tão pouco de economia quanto os ditadores que estudava.

"A pancada de 0,75%do Banco Centralno aumento da taxa de juros ainda não esfriou e seu presidente, doutor Henrique Meirelles, já está no circuito insinuando uma nova punição para economia nacional.

Comprou seu forno microondas? Sua mulher não precisa mais voltar para o fogão para servir janta? Vigodo ignóbil, você está aquecendo o consumo. Conseguiu um trabalho com a queda na taxa de desemprego? Ostrogodo inconsequente, você ofende a racionalidade econômica , abrindo caminho para um surto inflacionário.

Contra esses bárbaros só há um remédio, subir a taxa de juros brasileira que é, há tempo, a maior do mundo"

Elio Gaspari está há décadas acompanhando governos e planos econômicos e não conseguiu compreender que se os juros estão baixos demais, melhoram a vida Visigodos e Ostrogodos, mas pioram Celtas, Vándalos e de todos os povos que continuam sem acesso a crédito. Também não entendeu que a única maneira de se garantir que os mais pobres melhorem de vida é com políticas que atingam a todos, como inflação baixa.

Por essa clara dificuldade cognitiva, o professor Nicola de matemática, que acredita que ninguém pode ser tão bom em português e em história e tão ruim em matemática, resolveu oferecer-lhe a primeira bolsa de estudos de sua fundação.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Fiat lux, fiat money.

Ta um pouco tarde pra responder a querela que iniciou este blog (ver post de 4 de julho) mas vamos lá.

O texto (http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/prospect/2008/07/03/ult2678u175.jhtm) gerou certo rebuliço nos e-mails dos grupos de alunos do mestrado da PUC-RJ. Imediatamente pipocaram mensagens em uníssono ridicularizando o texto o quem o havia enviado. Como se fosse auto-evidente que o texto é uma merda. Pois ele não é. É um texto bem escrito, com intuições importantes, boas tiradas; mas sem dúvida é literário - não foi escrito por um economista. E deve ser lido com a leveza e irreverência a que se propõe.

A primeira fonte de críticas é não entender o que o texto está dizendo e achar que ele é uma crítica ao Capitalismo (ou no limite fruto de um pensamento de esquerda). No seu maniqueísmo o tipo de leitor ao qual me refiro, de cara se coloca contra o texto pois ele ofende economistas e banqueiros e ainda por cima cunha a feliz, e irritante para alguns, expressão “Capitalismo Incrível Hulk.” Distraídos por estas ofensas tais leitores não compreendem qual é o sentido do texto. Uma mistura de descrição estilizada e apologia ao capitalismo e ao sistema bancário. O Caruso até chega a perceber isso, mas aí acusa o autor de “retalho de metáforas.” Ora não há nada de contraditório entre a forma “Hulk” como o capitalismo se expande, e de vez em quando gera crises, e o fato do sistema de mercado prover uma ampla gama de produtos de massa e de forma descentralizada.

Depois vêm as críticas mais pontuais feitas ao texto. Até concordo com algumas, como em relação ao Padrão Ouro. Mas algumas clarificações são necessárias. Lendo com atenção vê-se que o autor retrata com precisão as idéias de Weber. Quando diz que “os primeiros protestantes viam o sucesso econômico como um sinal de Deus” ele se refere aos Calvinistas; não aos Luteranos. E o texto nunca disse que o capitalismo é uma nova forma de protestantismo.

Diz sim é que o capitalismo cumpre uma função social equivalente a da religião. Diz algo sobre a natureza humana. Que a “mágica de coordenação” que ele promove devolve o “mistério” à vida, e daí a necessidade de interlocutores que racionalizem o processo. Definir se homens precisam ou não de “mistério”, e qual é nossa relação com ele, está fora do campo da economia. Nem por isso é uma proposição vulgar ou superficial; é um tema muito importante para a filosofia ou teologia.

Ele acerta novamente com a “cientologia”. Ora, é um argumento totalmente plausível; e é irrelevante se o autor é ignorante em economia (ele é um leigo mesmo). Como vimos no “macro-lunch” deste semestre, o sistema financeiro se auto proclamava um grau de cientificidade nas avaliações de risco que não tinha. Isso não significa dizer que não usassem as melhores técnicas e mentes disponíveis. É reconhecer que o caráter sistêmico, imbricado e sigiloso das operações financeiras apresenta um desafio cognitivo monumental dificílimo de transpor e que isso não estava refletido nas avaliações.

Por isso o texto se salva.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Procura-se um reacionário

Minha manhã de hoje foi dedicada a tarefa de percorrer as livrarias do centro de La Paz em busca do livro Conversa na Catedral do Mario Vargas Llosa. Presumi, inocentemente, que não seria difícil encontrar aqui um livro do mais conceituado autor peruano e que pelo custo de vida boliviano, seria mais barato. Estava errado.

Sai cedo do hostel em direção a livraria recomendada pelo Lonely Planet. No caminho parei em uma livraria jurídica e perguntei se havia livros de literatura, o vendedor me respondeu de forma simpática que sim, mas logo descobri que só havia autores nacionais. Dei um crédito pois se tratava de uma livraria jurídica e já esperava algo assim.

Chegando na livraria recomendada, Amigos del libro, perguntei se havia algum livro de Vargas Llosa, o vendedor me olhou com a cara fechada subiu em uma estante e jogou sobre a mesa um exemplar de "A Cidade e os Cachorros". Perguntei se havia outros e ele me respondeu ainda mais emburrado que não. Sai sem entender.

Fui à outra livraria recomendada pelo guia, chegando lá me atendeu um vendedor inicialmente simpático cujo rosto se fechou ao responder que não tinha nenhum livro do Vargas Llosa. Já imaginando o que se passava, parti para provocação: -Y de Borges, no hay? Tampoco! Perguntei porque eu não conseguia encontrar livros desses autores e o vendedor me respondeu que não vendiam livros de reacionários.

A epopéia se seguiu por 8 livrarias. Na maioria delas, os atendentes não foram grossos, simplemente não tinham livros de nenhum dos dois autores, muito embora biografias do Evo Morales caíssem em meu colo e Gabriel Garcia Marques e Isabel Allende abundassem nas prateleiras, vendidos a 25 Bolivianos.

Na oitava livraria, quando já estava disposto a comprar na Amazon, encontrei algumas obras do Vargas Llosa e por sorte, Conversa na Catedral, bem mais caro do que esperava, 90 bolivianos. Perguntei-os por que eu não encontrava em mais lugares obras dele e simplemente me responderam que não são mais publicadas.

Sou daqueles que acham que todo livro deve ser acessível, mesmo Minha Luta do Hitler (que aliás eu vi em uma estante), e que quem perde com isso são os bolivianos, que ficam mais fechados ao resto do mundo.