Luis Carlos Bresser Pereira ocupou o ministério da fazenda por um período de tempo durante o governo Sarney e falhou em combater a inflação. Muitos consideram que não foi capaz de fazê-lo por causa do arcabouço político desfavorável. Entretanto, no artigo publicado ontem no Valor, ele mostra que em sua teoria, inflação é uma condição para o crescimento.
Depois de passar parágrafos, descrevendo (mal e recheado de ironias) como os ortodoxos explicam a variação na conta corrente, ele resolveu expôr o seu ponto.
"Nossa visão é oposta. Ainda que haja um componente institucional e cultural determinação da poupança interna, esta é determinada no curto prazo pela taxa de câmbio. Quando esta se deprecia, como aconteceu em 2002, a taxa real de salários diminui, o consumo cai, e a poupança interna aumenta. Foi exatamente o que aconteceu com o Brasil em 2003. Em seguida, com a nova e gradual apreciação do câmbio, os salários e o consumo aumentam e a poupança volta a cair, como vemos no gráfico. Como além disso, o ritmo do crescimento das exportações cai e, com uma defasagem, aumentam as importações, o país entra em regime de défict em conta corrente e de novo ciclo de fragilização interna. ... De acordo com esse raciocícnio é a taxa de câmbio que determina a poupança e não o contrário."
Bresser não consegue separar claramente o que são variáveis exógenas e endógenas. Atualmente vivemos em um modelo de câmbio flexível e, portanto, sua cotação é uma variável endógena. Nem que o BC quisesse ele conseguiria desvalorizar o câmbio.
Bresser precisa ser mais claro em sua posição. Se o que ele sugere é que mudemos para um câmbio fixo ou mixto, ele deveria dizê-lo. A outra aleternativa é que ele sugere que o BC baixe a taxa de juros para que capital saia e o câmbio se desvalorize, mas segundo ele mesmo, assim não sairíamos desse ciclo. Não deixar claro suas sugestões é uma desonestidade com o leitor.
Correndo o risco de me passar por cartomante, o que ele provavelmente sugere é uma mistura de ambas as alternativas. As consequências perniciosas da adoção de tal tese, ele mesmo descreve: redução dos salários reais (através do aumento da inflação) e redução no consumo, para assim aumentar a poupança e o investimento. Traduzindo é a velha tese de deixar o bolo crescer para depois dividir. Os trabalhadores subsidiando o investimento dos empresários, tese que levou o Brasil à hiperinflação e a ter uma das maiores desigualdades do mundo.
Mais alguns parágrafos e ele conclui:
"Na verdade, o grande desafio da política macroeconômica em um país em desenvolvimente é o de neutralizar a sobreapreciação cambial. Mas não é isso que ensina a ortodoxia convencional vinda do Norte. Para os países ricos, não há nada melhor do que uma taxa de câmbio sobreapreciada nos seus concorrentes do Sul. Os interesses nacionais são claros. E a teoria econômica ainda mais clara."
Todo ortodoxo tem alguma crença heterodoxa. O mainstream precisa das críticas para avançar. No entanto, heterodoxos no Brasil raramente possuem pontos que acrescentam algo a teoria econômica. A maioria é desatualizada, não tem base matemática, desconhece técnicas para testar teorias e precisa se basear quase exclusivamente na retórica para defender seus pontos. Alguns, como Bresser no parágrafo acima, chegam ao extremo de usar argumentos microfascistas para excluir respostas advindas de livros vindos do norte.
-Não os leiam, a teoria econômica é clara, e eu parecerei antiquado.
Há 3 anos
21 comentários:
“heterodoxos no Brasil raramente possuem pontos que acrescentam algo a teoria econômica. A maioria é desatualizada, não tem base matemática, desconhece técnicas para testar teorias e precisa se basear quase exclusivamente na retórica para defender seus pontos. Alguns, como Bresser no parágrafo acima, chegam ao extremo de usar argumentos microfascistas para excluir respostas advindas de livros vindos do norte.”
Isso é a sua opinião. Longe de ser verdade, a maioria dos heterodoxos que eu conheço “acrescentam algo a teoria econômica”, afinal teoria econômica não é um consenso, é um conjunto de discordâncias. Sobre a desatualização, também não é verdade, talvez a maioria seja bastante atualizada, pois também sofrem constantes críticas de dentro e de fora do mainstream. Você tem razão na fraca base matemática, mas os heterodoxos que têm fraca base matemática usam métodos diferentes (e claro que não é retórica...) para debater economia, uns mais próximos da história outros não.
A meu ver, determinadas correntes do pensamento em economia (principalmente em economia política) são tão diferentes do que estudamos aqui na Puc-Rio que é um absurdo chamar todas essas teorias de economia. O uso de argumento microfascistas eu não conhecia, mas quem não lê os livros do norte, por que são do norte, não sabe o que fala...
Bernard,
É apenas a minha opinião, como alías tudo que escrevo, mas eu vou dar-lhe a change de provar que estou errado. Cite um artigo de um economista heterodoxo brasileiro publicado em uma revista top 5 no mundo que eu prometo lê-lo e comentá-lo no blog.
Em tempo, o argumento microfascista é precisamente aquele sobre não ler livros do norte. E o termo não é meu, é do Foucault.
mas o que são journals top 5? com a especialização na profissão, você tem um problema de auto-seleção, e será incapaz de avaliar sua proposição. Para entender o meu ponto, submeta-se ao experimento contrário: tente achar um artigo de um economista ortodoxo brasileiro no Journal of Economic Methodology.
Caro Tiago segue conforme solicitado.
Peço a gentileza de descer do salto, abrir um post e comentar o paper do PAULO GALA.
Cambridge Journal of Economics,Vol 32 (2008)
Gala, Paulo.
Real exchange rate levels and economic development: theoretical analysis and econometric evidence pp. 273-288
Peraí, muita calma. Não concordo exatamente com o Caruso. Não acho que um heterodoxo tenha que publicar nada em journals tipicamente ortodoxos. Mas esse cambridge journal aí não é top 5 e nem é ortodoxo. Olha o nome de um paper do último issue do journal:
Newton's real influence on Adam Smith and its context.
Pera aí Rafael, muita calma digo eu.
O Caruso deveria ter estabelcido as regras do jogo antes, hahá.
Entretanto, olhando as especificações da revista (http://www.oxfordjournals.org/our_journals/cameco/about.html)percebe-se que é uma revista completamente heterodoxa.
Mas isso não impede que trate de assuntos da ortodoxia.
E levando em conta a importancia do Journal, it has an impact factor of 0.7 and is ranked 91/191 in the Economics category of the ISI Journal Citation Reports (2008).
Assim, do mesmo modo que não se deve comprar o Journal pela capa, não se deve jogar a heterodoxia toda no mesmo saco.
Quem consegue classificar o Delfin ? O que ele é nessa infame categorização dos economistas ?
abs.
THM
Delfim publica nos top 5 jornais brasileiros: Folha de São Paulo, Estado de São Paulo, Valor Econômico, O Globo e Gazeta Mercantil
Thiago Maia,
Então eu leria 90 journals antes de ler esse cambridge. Independente da regra que a gente defina, isso não vai classificá-lo como top 5.
Eu não coloquei qual eram os Top Journals porque sabia que alguém ia aparecer com o argumento que isso é relativo ou eles não publicam artigos heterodoxos.
Nem um dos argumentos procede. Existem diversos rankings e artigos publicados que trabalham com o índice de citações como o índice de Kalaitzidakis e a variância das colocações é bem pequena. Vou listar 6 revistas para compensar as pequenas discrepâncias. Aceito para o desafio: American Economic Review; Econometrica; Journal of Political Economy; Quarterly journal of Economics; Journal of Economic Theory e Journal of Finance.
A segunda falácia: essas revistas são ortodoxas e não publicariam conteúdo heterodoxo. Se o artigo acrescenta algo a teoria econômica, elas publicam. Diversos temas nada ortodoxos já foram publicados nelas como: custos de menu, desemprego involuntário, quase-racionalidade, spillover do investimento, preços fixos, desconto hiperbólico, complementaridades e por ai vai. Diversas contribuições heterodoxas e até onde eu saiba, nenhuma brasileira.
O desafio continua, mas Thiago, fiquei até com vontade de ler esse trabalho.
aaaaah se isso é heterodoxia então o sheinkman é heteredoxo, com diversas publicações internacionais. Só para dar um mísero exemplo: Sheinkman, & Soutter (2000) 'Measuring trust' - Quarterly Journal of Economics, 2000 . Definitivamente "trust" não é um tópico walrasiano.
O que, em verdade, diferencia ortodoxia de heterodoxia não é o tópico, mas a metodologia. Segundo Sheila Dow (pode procurar, ela tem muitos artigos no Journal of Economic Methodology... mas nenhum nos 5 que você citou), ortodoxia só admite um método, enquanto heterodoxia admite uma pluralidade. Já que o post é sobre o Bresser, parafraseando o velho mestre, tenho um artigo sobre o assunto (não está publicado em nenhum dos 5 journals que você citou... nem no Journal of Economic Methodology!)
Guilherme,
Ele publicar nesses jornais não estabelece seu caracter ortodoxo ou heterodoxo,
o que mostra é que ele é um economista influênte.
Mas seu ultimo artigo vem batendo nas decisões do Bancen, que a heterodxia tanto defende.
O hilário, é que ele é tirou o coelho do chapéu: bateu na ortodoxia brasileira através dos insumos da ortodoxia americana,
tão cultuada por esse economistas, ultimamente.
Rafel,
Estou certo que você leria mesmo.
Mas, seria no mínimo estranho a revista de Cambrigde precisar estar no "top five' de vocês.
(Alias, só agora é que o Caruso criou um.)
Afinal foi de lá que sairam as grandes idéias quando a ortodoxia não conseguia mais "raciocinar".
(desculpe, não pude evitar a piada)
Caruso,
Bom saber de sua excelente capacidade de prever o futuro.
Na onde você estuda eles ensinam quiromancia?
(por esse argumento você não esperava!) brincadeira...
Em relação as revistas, o Brasil, está subindo no ranking das publicações científicas.
Atualmente é o 15°. (http://aprendiz.uol.com.br/content/ledristesh.mmp)
Se for bacana, leia e poste depois os comentários...
Caros desculpem o equivoco nesse paragrafo:
"Mas seu ultimo artigo vem batendo nas decisões do Bancen, que
a "heterodxia" tanto defende."
O que eu quis dizer foi:
que a ortodoxia tanto defende.
É realmente desagradável ter que debater com alguém cujo argumento se baseia em escrever haha e ofender os outros. Só reitera o que eu disse sobre basear a discussão em retórica.
Envio abaixo alguns links de rankings de revistas de economia,inclusive o artigo do Kalaitzidakis. No caso de alguém achar que eu inventei os melhores.
http://www.econ.ucy.ac.cy/papers/0110.pdf
http://www.jedc.com/bin/Rankingwp0512.pdf
http://www.le.ac.uk/economics/research/rankings/jrank.xls
http://www.bm.ust.hk/econ/JEEA.Ranking.pdf
Não é preciso quiromancia para conhecer as desculpas que os heterodoxos no Brasil usam para justificar sua incompetência.
Delfin eu não conheço. Delphin era o herdeiro do trono da França. O Delfim Netto, sem sombra de dúvida, é heterodoxo e ele não escreve no Globo.
Guilherme,
Trust deixou de ser um tópico heterodoxo em 1940.
Prezados,
Creio que não estamos claros (estamos confundidos, heheheh...) na diferenciação entre ortodoxos e heterodoxos. Na mesma linha do Guilherme, a diferença está no método. Conheço um artigo (do Cambridge journal of economics, heheh) muito interessante que discute as principais diferenças com bastante propriedade, eu achei o artigo realmente bom:
Lawson, Tony. The nature of heterodox economics. Cambridge journal of economics, 2006 (30) p.483-505.
PS: O Delfim escreve na Carta Capital também...
Bernard, o que acha de fazer o próximo post sobre esse tema tão controverso? hehehe
Bresser, o genio renascentista disse:
"Ainda que haja um componente institucional e cultural determinação da poupança interna, esta é determinada no curto prazo pela taxa de câmbio. Quando esta se deprecia, como aconteceu em 2002, a taxa real de salários diminui, o consumo cai, e a poupança interna aumenta. Foi exatamente o que aconteceu com o Brasil em 2003. Em seguida, com a nova e gradual apreciação do câmbio, os salários e o consumo aumentam e a poupança volta a cair, como vemos no gráfico. "
A parte que eu mais gostei foi a sabotagem... "como vemos no grafico", sabemos todos que o cambio real brasileiro se APRECIOU desde 2003, entretanto, o grafico mostra nenhum declinio da taxa de poupanca (ao contrario da assertiva do genio renascentista).
Essa gente nao tem amigos? Eu nao colocaria nada na imprensa sem mostrar antes para meus amigos, que acredito, nunca deixariam eu passar um ridiculo desses!
Não sei se vocês perceberam, mas em nenhum post foi discutido se a teoria do Bresser era ou não válida. O Caruso apresentou seus pontos, mas ninguém apresentou contra-pontos que defendessem a idéia.
Ficar discutindo as -xias é perda de tempo. Se houver uma teoria boa ela é incorporada ao main-stream e ponto. Seja ela fácil ou difícil de encarar pelos defensores de qualquer coisa. Veja Jogos, e as teorias de mercados imperfeitos em geral.
O que não dá para ser feito é inventar a roda a todo segundo. Temos que concordar com coisas básicas, como as teorias de consumidor e produtor, a contabilidade nacional, para que haja discussão.
Anonimo, muito boa a colocação.
Eu pensei, pouco me importa o que tem lá, ele não vai me convencer mostrando um gráfico. Não imaginei que ele ia se contradizer lá. Se tivesse percebido isso o post teria sido bem melhor.
O problema do Bresser eh que ele nao deve ter nenhum amigo. Apenas narizes marrons, gente mediocre, que depende ou dependeu dele para sua carreira, e nao desafia-o em suas ideias.
Entao, em um ambiente acomodado, ele realmente se acha um genio renascentista, capaz de escrever sobre diferentes topicos e campos de conhecimento... O unico problema eh que pelo menos no unico campo de conhecimento que esse pobre missivista tem algum dominio, a economia, o homem eh um desastre. (Dah ateh medo de saber a qualidade de sua obra em administracao...)
Uma das passagens mais engracadas do Bresser foi quando ele deu de escrever sobre os EUA, (cito livremente) enfatizando o quanto a qualidade da lideranca politica declinou nos ultimos 50 anos (!)... Isso vindo de um sujeito que foi ministro da fazenda de um pais com uma hiperinflacao... Eh a completa, desbundante, despudorada ausencia do senso do ridiculo.
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