terça-feira, 5 de agosto de 2008

Fiat lux, fiat money.

Ta um pouco tarde pra responder a querela que iniciou este blog (ver post de 4 de julho) mas vamos lá.

O texto (http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/prospect/2008/07/03/ult2678u175.jhtm) gerou certo rebuliço nos e-mails dos grupos de alunos do mestrado da PUC-RJ. Imediatamente pipocaram mensagens em uníssono ridicularizando o texto o quem o havia enviado. Como se fosse auto-evidente que o texto é uma merda. Pois ele não é. É um texto bem escrito, com intuições importantes, boas tiradas; mas sem dúvida é literário - não foi escrito por um economista. E deve ser lido com a leveza e irreverência a que se propõe.

A primeira fonte de críticas é não entender o que o texto está dizendo e achar que ele é uma crítica ao Capitalismo (ou no limite fruto de um pensamento de esquerda). No seu maniqueísmo o tipo de leitor ao qual me refiro, de cara se coloca contra o texto pois ele ofende economistas e banqueiros e ainda por cima cunha a feliz, e irritante para alguns, expressão “Capitalismo Incrível Hulk.” Distraídos por estas ofensas tais leitores não compreendem qual é o sentido do texto. Uma mistura de descrição estilizada e apologia ao capitalismo e ao sistema bancário. O Caruso até chega a perceber isso, mas aí acusa o autor de “retalho de metáforas.” Ora não há nada de contraditório entre a forma “Hulk” como o capitalismo se expande, e de vez em quando gera crises, e o fato do sistema de mercado prover uma ampla gama de produtos de massa e de forma descentralizada.

Depois vêm as críticas mais pontuais feitas ao texto. Até concordo com algumas, como em relação ao Padrão Ouro. Mas algumas clarificações são necessárias. Lendo com atenção vê-se que o autor retrata com precisão as idéias de Weber. Quando diz que “os primeiros protestantes viam o sucesso econômico como um sinal de Deus” ele se refere aos Calvinistas; não aos Luteranos. E o texto nunca disse que o capitalismo é uma nova forma de protestantismo.

Diz sim é que o capitalismo cumpre uma função social equivalente a da religião. Diz algo sobre a natureza humana. Que a “mágica de coordenação” que ele promove devolve o “mistério” à vida, e daí a necessidade de interlocutores que racionalizem o processo. Definir se homens precisam ou não de “mistério”, e qual é nossa relação com ele, está fora do campo da economia. Nem por isso é uma proposição vulgar ou superficial; é um tema muito importante para a filosofia ou teologia.

Ele acerta novamente com a “cientologia”. Ora, é um argumento totalmente plausível; e é irrelevante se o autor é ignorante em economia (ele é um leigo mesmo). Como vimos no “macro-lunch” deste semestre, o sistema financeiro se auto proclamava um grau de cientificidade nas avaliações de risco que não tinha. Isso não significa dizer que não usassem as melhores técnicas e mentes disponíveis. É reconhecer que o caráter sistêmico, imbricado e sigiloso das operações financeiras apresenta um desafio cognitivo monumental dificílimo de transpor e que isso não estava refletido nas avaliações.

Por isso o texto se salva.

3 comentários:

Guilherme Lichand disse...

Foi bem, Lucas. O que me chamou a atenção nesse texto, a reflexão que ele despertou em mim, foi justamente o quanto de misticismo envolve um corpo de conhecimento que se pretende tão científico...

Devo postar em breve algumas provocações sobre esse esforço de cientificidade, algumas idéias da filosofia sobre verdade e progresso.

Tiago Caruso disse...

Fico feliz que concordemos sobre a pobreza do aspecto econômico do texto. Falemos de outros.

Filosoficamente o texto é ruim. Confunde as definições de fé e incerteza. É etnocêntrico, o autor chama de místico o que não compreende e acredita que a curiosidade é a razão pela qual as pessoas investem.

Eu quis me ater ao lado econômico do texto e não fazer uma crítica literária. Mas ele é, de fato,um retalho de metáforas, em sua maioria extravagantes e que pouco acrescentam.

Em tempo, o fato dos modelos de previsão de risco do mercado financeiro terem se mostrado errados não implica que suas avaliações não são científicas. Pelo contrário, implica que são.

lucas disse...

Caruso, Popper 1.0.1., for favor!!! O falseacionismo como critério de cientificidade é demarcar exatamente quais tipos de erros devem fazer com que joguemos a teoria no lixo. Apenas errar nao é sinal de cientificidade!!