domingo, 15 de novembro de 2009

A Crise e os Bancos Públicos


A recente onda de divulgação de balanços trouxe algumas questões interessantes a respeito do comportamento dos bancos públicos brasileiros durante a crise. Primeiramente, como a pressão do governo federal para o afrouxamento da concessão de crédito afetou a composição das carteiras? E, em segundo lugar, houve piora no nível de risco das carteias de crédito?

A tabela abaixo demonstra que as carteiras do BB e do Bradesco estavam se comportando de uma maneira bastante semelhante antes da crise, fato que mudou consideravelmente após setembro de 2008. Fazendo as hipóteses de que a crise econômica afetou todos os bancos brasileiros da mesma forma e que o Bradesco é um bom matching para o BB então a componente pressão do Governo Federal teve o efeito de aumentar a carteira de crédito do BB em cerca de 18% (27.12% - 8.64%).

Mas estas hipóteses não são muito realistas. De fato a tabela 1 evidencia que a captação do BB cresceu muito mais do que a do Bradesco entre setembro de 2008 e setembro de 2009, pois ele é visto pelos agentes como risk-free. Tal fato aumentou a diferença entre os custos de funding do BB e do Bradesco, o que teve efeitos sobre a quantidade de recursos emprestados.

Assim, a identificação exata do efeito da pressão do GF sobre a concessão de crédito é bastante complexa e irá requerer técnicas mais avançadas (cenas para um próximo capítulo).



A tabela 2 apresenta a porcentagem da carteira de crédito aplicada em cada um dos nove níveis de risco definidos pela resolução 2682 do BACEN. Para tornar mais fácil a comparação defini valores arbitrários para cada classe (AA=9, A=8, .... H=1), o que é apresentado sob o título Agregado. Analisando os resultados podemos perceber que a despeito do acelerado crescimento da carteira de crédito do BB não houve significativo incremento no nível de risco de suas operações.



Uma possível explicação para este fato é que a expansão das operações que envolvem algum nível de garantias (crédito consignado, financiamento imobiliário, financiamento de automóveis, etc) corresponderam com algo entre 40 e 50% da expansão da carteira de crédito.

Então fica a dúvida: será que os bancos privados forma conservadores demais na concessão de novos empréstimos ou será que os resultados nefastos sobre a carteira do BB ainda estão por vir?

11 comentários:

Theo disse...

Gaucho (augusto):

A evolução da carteira não reflete fundamentos forward-looking. Note que a inadimplência será conhecida somente daqui 3-6 meses para essa abertura de crédito do BB. De qualquer maneira, o banco pode inclusive sair melhor caso a inadimplência seja superior: eu já trabalhei em uma área de cartões e o grosso da receita lá era atraso / refinanciamento de operações. Isso significa que era "bom" ver pessoas atrasando e refinanciando pagamento, porém depois pagando. O importante é sempre minimizar a carteira (em PF ao menos) que vai ser jogada a perda (>180d).

Meu palpite é: se a crise não voltar, o resultado do BB vem forte nos próximos trimestres. Se voltar, lá vem chumbo grosso pois, como sabemos, os critérios de concessão de crédito do BB são menos avançados que dos concorrentes.

M disse...

Eu acho que a lição mais importante desse post é que as constantes declarações do governo e do BB sobre sua pró-atividade frente à crise, propagandeado como misto de coragem com "acreditar no Brasil" em grande parte era apenas bravata.

É muito fácil ser corajoso quando, por um motivo exógeno (garantias implícitas do governo federal), está havendo saques nos concorrentes e depósitos no seu banco.

Anônimo disse...

alguém por aqui leu a entrevista do torós pro valor na sexta 13/11?

se não tem o BB comprando as carteiras de bancos médios a coisa poderia ser muito pior


Doutrinador

Theo disse...

Doutrinador,

Eu li e concordo com você. Além disso, vale mesmo questionar até que ponto esses diretores do Bacen podem sair dando entrevista e falando dados tidos como sigilosos por ai?

Todo mundo sabe que ele (Torós) quer sair o quanto antes. O que me espanta é a falta de caráter ao sair dando entrevista para forçar uma saída rápida. Espero que o mercado precifique isso no próximo salário dele.

Anônimo disse...

Eu acho que a lição mais importante desse post é que as constantes declarações do governo e do BB sobre sua pró-atividade frente à crise, propagandeado como misto de coragem com "acreditar no Brasil" em grande parte era apenas bravata.

Segundo a tabela do nosso amigo, o crédito total do BB aumentou 27,12%, enquanto o do Bradesco, 8,64%.

A diferença na captação reflete a opção do Bradesco de não conceder mais crédito. A opção do BB foi política e fez diferença.

M disse...

Anônimo,

Acho que você não entendeu o que eu quis dizer.

Meu ponto é que esse crescimento é conseqüência natural do aumento de depósitos no BB e diminuição de depósitos no Bradesco.

Theo disse...

Rafael,

O que o anônimo quis dizer é uma "causalidade" reversa: o Bradesco não quis dar mais crédito, portanto precisou de menos funding. O que vc supoe em sua análise é o inverso: queda do funding --> queda no crédito.

Acho difícil separar os dois efeitos e discutir causalidade.

Augusto Vanazzi disse...

Na real eu acho que foram as duas coisas. A base de depósitos do Bradesco cresceu pouco, o que evidencia a redução de funding, e as captações no mercado também, o que evidencia a falta de apetite em emprestar.

BB:
Var Depósitos à vista: 7,15%
Var Depos a prazo: 67%
Var Poupança: 19,5%
Var Captações: 68%

Bradesco
Var Depósitos à vista: 10
Var Depos a prazo: 27
Var Poupança: 15
Var Captações: 18%


abs

M disse...

O Augusto tinha me explicado (isso não está no post) que essa captação é na forma de depósito.

Se isso for verdade, acho impossível alguém acreditar em causalidade reversa nesse caso.

Se captação for geral (empréstimos e depósitos), aí concordo com vocês.

Anônimo disse...

sobrou dinheiro pro BB...mesmo.

engraçado que quem assume agora no lugar do torós é um daqueles que foram tomados como conservadores demais e substituidos do BB que 'nao emprestava' até abril/09


Doutrinador

Guilherme Lichand disse...

bom post de estreia!