domingo, 10 de janeiro de 2010

Está cada vez mais difícil acreditar na hipótese Serra-mentiroso.

A política macroeconômica estável foi o pilar que permitiu o desenvolvimento nos últimos 15 anos. Para ser mais específico o Brasil começou deslanchar quando estabeleceu como base da política monetária: câmbio flutuante, meta de inflação e superavit primário.

No entanto, ambos os candidatos a presidência da República parecem abominar o famigerado tripé. Surpreendentemente, o Serra mais do que a Dilma ataca a política monetária.

O que defensores de uma política macroecônomica responsável normalmente acreditam é que o Serra só reclama da valorização do câmbio e da taxa de juros da-boca-para-fora. E parecem se contentar com isso.

Para mim parece pouco. Das duas uma: ou temos um Serra-mentiroso, reiteradamente falando que vai mexer no câmbio e combater as taxas de juros elevadíssimas e não vai, ou temos um Serra-ignorante, incapaz de compreender e capitalizar os resultados da atuação de membros de seu partido.

Sinto informar aos partidários da hipótese do Serra-mentiroso, que está cada vez mais difícil acreditar na existência dele. Quando interpolado sobre a decisão da ministra Dilma de rechaçar as metas de desmatamento o governador gratuitamente mostrou sua habital ignorância econômica.

“Os juros siderais e o câmbio mega-hiper-valorizado são muito piores para o desenvolvimento do que qualquer medida de defesa do meio ambiente”

Agora foi a vez de um outro membro da "elite" tucana, o presidente do partido Sergio Guerra, em entrevista à Veja, mostrar que o Serra-ignorante está aí para valer. Sua autoridade disse:

"Iremos mexer na taxa de juros, no câmbio e nas metas de inflação. Essas variáveis continuarão a reger nossa economia, mas terão pesos diferentes. Nós não estamos de acordo com a taxa de juros que está aí, com o câmbio que está aí. Estamos criando empregos no exterior. Os últimos resultados da balança comercial são negativos. Precisamos estabelecer mecanismos para criar empregos no Brasil. Espero que a sociedade nos compreenda."

Está ficando difícil acreditar.

25 comentários:

"O" Anonimo disse...

Eu discordo 120% de você, Tiago.

Serra está falando sobre um problema real que o governo atual escolheu não resolver.
Os juros são de fato altos demais no Brasil. Isso é absolutamente inegável. Assim como me inegável que estes juros altos taxam nossa capacidade de investimentos e gerar empregos (poxa vida, isso é Macro Básica!). Também é verdade que a taxa de câmbio de fato reflete não só a competitividade de nossas exportações, mas também estes juros altos.

Sim, os juros são justificáveis como uma reação endógena à política fiscal expansiva da administração no poder e à política sancionada pela administração de manter o sistema de crédito dirigido. Mas isso não quer dizer que eles não sejam uma febre sintomática de uma síndrome que aleija.

Explica então para mim: como que o Serra vai conseguir se eleger dizendo que vai cortar gastos e desmantelar o sistema de crédito dirigido para assim criar espaço para os juros caírem? Ele tem mais que atacar os juros altos. Mesmo porque os juros altos não pertencem ao PSDB, mas sim são uma escolha consciente de política econômica do presidente Lula. Escolha esta que ele teve uma oportunidade única de abandonar em 2009, mas se recusou.

Michel disse...

"O",

Agora, pra te citar, sou eu que "discordo 120% de você". Explicar onde: "Mesmo porque os juros altos não pertencem ao PSDB, mas sim são uma escolha consciente de política econômica do presidente Lula.". Não...essa é uma escolha de política econômica da sociedade brasileira e do sistema tributário estabelecido na constituição de 1988. A sociedade brasileira já há muito tempo escolhe gastos altos para fazer redistribuição de renda, e esse crescimento de gastos só são financiáveis por uma carga tributária excessiva e distorciva, dada a forma como o federalismo fiscal foi adotado no Brasil.

"Escolha esta que ele teve uma oportunidade única de abandonar em 2009, mas se recusou." Agora é economia política básica: qualquer político em final de mandato faria a mesma coisa do Lula (não é uma coisa do PT, mas sim, da política): o Lula não aproveita os ganhos políticos de fazer uma política fiscal descente que vá permitir baixar os juros em 2011. Pelo contrário, fazendo isso, ele pode perder a chance de voltar em 2014.

Em outras palavras: quem quer que seja o político eleito, ele não vai conseguir desmontar a cagada tributária da constituição de 1988, pois isso depende de tirar verbas dos estados, que os senadores não deixam. Não acho que a desigualdade de renda ocorrida no período do presidente Lula tenha caído o suficiente para permitir uma queda nos gastos demandados políticamente pela população (lembrando: políticas de empregos públicos também são políticas de redistribuição de renda para trabalhadores). Em outras palavras, "O", eu acho que quando o Serra fala de juros, ele NÃO está falando, para os conhecedores de economia, sobre gastos, nem de política tributária responsável, pois de fato o sistema político dá pouca margem para mexer nisso agora.

Ainda mais, devo falar que eu acho bastante burro politicamente trazer a cartada dos juros altos agora, quando a população parece acreditar que a política monetária do governo Lula foi bem conduzida (só quem acredita que a política monetária deve mudar são economistas heterodoxos, não o povão...). Acho que existem muitas formas mais eficazes eleitoralmente de bater no governo que essa....

Opiniões minhas...você discorda?

"O" Anonimo disse...

"Não...essa é uma escolha de política econômica da sociedade brasileira e do sistema tributário estabelecido na constituição de 1988."

Errado. Falso. Batatada. A sociedade não forcou o governo a fazer política fiscal expansiva antes dos juros NOMINAIS caírem para perto de zero.

"A sociedade brasileira já há muito tempo escolhe gastos altos para fazer redistribuição de renda, e esse crescimento de gastos só são financiáveis por uma carga tributária excessiva e distorciva, dada a forma como o federalismo fiscal foi adotado no Brasil."

??? Estou falando da resposta ciclica do mix de politica economica desde o começo da crise. 

"Agora é economia política básica: qualquer político em final de mandato faria a mesma coisa do Lula (não é uma coisa do PT, mas sim, da política): o Lula não aproveita os ganhos políticos de fazer uma política fiscal descente que vá permitir baixar os juros em 2011. "

Errado. Os juros HOJE poderiam ser 5% e TODA a comunidade financeira internacional estaria aplaudindo o Brasil.

O único motivo que os juros não caíram mais do que caíram foi a reticência do Principe de perder o poder de mandar e desmandar no setor privado que ele detém devido aos juros altos e aa relação de dependência que os juros altos impõem entre o "grande capital" (leia-se Vale, Votorantim etc) e o poder do Principe de distribuir credito subsidiado via BNDES.

Michel disse...

Acho que a nossa diferença está no fato de que você acha que o Serra está criticando juros durante a crise, enquanto que eu acho que o Serra está criticando juros "de equilíbrio"/neutros. Seguem as minhas tréplicas e o porquê da minha crença ser essa.

"Errado. Falso. Batatada. A sociedade não forcou o governo a fazer política fiscal expansiva antes dos juros NOMINAIS caírem para perto de zero."

Realmente, não entendi. Os juros NOMINAIS caírem para perto de zero? Você tá falando do Brasil durante a crise com juros de 8,75%? Quando? Ou é dos EUA? Ou você quis dizer juros reais? Agradeceria por qualquer explicação.

"Estou falando da resposta ciclica do mix de politica economica desde o começo da crise."

O Serra está atacando o fato de que os juros são "permanentemente" altos no Brasil, não os juros altos durante a crise. Citando a frase do Serra de novo: “Os juros siderais e o câmbio mega-hiper-valorizado são muito piores para o desenvolvimento do que qualquer medida de defesa do meio ambiente”. Ele está falando em desenvolvimento (longo prazo) e não em política cíclica.

Sendo assim, o ponto não é de "resposta ciclica do mix de politica economica desde o começo da crise", e sim, de juros neutros/de equilíbrio altos. Se esses juros de equilíbrio são altos em parte por causa do tamanho do estado brasileiro (por gerar taxação de capital ineficiente; por exacerbar o papel de crédito direcionado reduzindo a potencial relevância de bancos privados; entre outros), aí entram os meus pontos de que essa é uma escolha de redistribuição de renda da sociedade brasileira e do sistema tributário da constituição e não uma questão de política expansiva antes/depois da crise, como na primeira frase tua que eu citei aqui. De novo, o próximo presidente não vai mudar nada disso, e por isso, eu não concordo que, ao criticar juros altos, o Serra esteja subliminarmente falando de política fiscal responsável.

"Errado. Os juros HOJE poderiam ser 5% e TODA a comunidade financeira internacional estaria aplaudindo o Brasil."

Acho que eu escrevi mal. Quando eu falei em "o Lula não aproveita os ganhos políticos", eu quis dizer "não aproveita todos os ganhos políticos". Pode aproveitar alguns. Porém, só o fato de que essas mudanças em disciplina fiscal geram crescimento no próximo governo (via queda de juros) já é suficiente para dizer que o Lula não aproveita todos os ganhos políticos de fazer essas mudanças. Ainda existe a perda política de diminuir as chances do Lula voltar em 2014. Ou seja, o ponto não é de juros HOJE, mas sim, de juros em 2011. Políticos no lugar do Lula agora não gerariam a mudança em disciplina fiscal necessária para baixar os juros a 5%.

A tua tese política do poder de usar o BNDES é interessante, mas não sei se ela é coerente com as mudanças regulatórias bancárias/SELIC lá pra 2005/2006 que foram parte do que permitiu que o crédito para pessoa jurídica tivesse juros caindo radicalmente entre 2005-2007. Mas sobre isso, eu num falo muito...

Theo disse...

Meu comentário iria na linha do que o "O" falou, porém ele já se adiantou. Concordo 200% com você, "O".

E sim, eu tenho esperança de que o Serra terá o pé no chão e, colocará um freio na política fiscal (cíclica, anti-cíclica, acícilica...) do companheiro Lula.

Tiago Caruso disse...

O,

é óbvio que as taxas de juros elevadas são um problema, não é necessário o mínimo de estudo de economia para saber disso, mas como você mesmo disse, elas são um sintoma.

No entanto, o seu candidato não parece pensar assim. Como ele mesmo disse em entrevista ao Globo do dia 31/12/2009:

"Temos um problema macroeconômico de curto prazo muito sério, antes de falar em longo prazo. O Brasil está de alguma maneira numa armadilha, que tem três lados: os maiores juros do mundo, já há muitos anos; a taxa de câmbio talvez hoje mais valorizada do planeta; e uma explosão de gastos correntes como nunca houve em valores reais."

Repare bem, ele não disse: Temos um problema de gasto público muito elevado, que faz com que a taxa de juros seja elevada para conter a inflação, o que, por sua vez, faz com que a taxa de câmbio se valorize.

Eu acho que o Serra é uma pessoa sincera (na medida que um político pode ser), por isso mesmo me assusta quando ele diz que temos 3 problemas e não um só. Ele vai querer prescrever portanto 3 remédios.

Isso não foi uma entrevista isolada, ele reiteradamente acena com o Serra-ignorante. Não dá para ficar ignorando isso e acreditando no Serra-mentiroso.

"O" Anonimo disse...

“Acho que a nossa diferença está no fato de que você acha que o Serra está criticando juros durante a crise, enquanto que eu acho que o Serra está criticando juros "de equilíbrio"/neutros.”

Eu acho que não existe nenhum aparato teórico dentro da macroeconomia mainstream que justifique a taxa real neutra do Brasil ser tão mais alta que todos os outros países (exceto a Turquia).

“Realmente, não entendi. Os juros NOMINAIS caírem para perto de zero? Você tá falando do Brasil durante a crise com juros de 8,75%? Quando? Ou é dos EUA? Ou você quis dizer juros reais? Agradeceria por qualquer explicação.”

O que eu quis dizer é que a política fiscal deve ser utilizada como último recurso quando não há espaço algum para a política monetária, e isso acontece quando os juros nominais estão perto de zero.

“O Serra está atacando o fato de que os juros são "permanentemente" altos no Brasil, não os juros altos durante a crise.”

No que ele está perfeitamente correto.

Enquanto o Bacen estava construindo sua credibilidade, fez sentido termos juros reais altos, mas isso é passado, foi um período transicional que passou.

Quanto à sua teoria, eu não faço a mínima idéia qual a conexão entre ‘taxação de capital ineficiente’ ou ‘tamanho do estado’ e taxas de juros reais. Nos últimos 10 anos, não houve um único ano em que as taxas de juros reais médias na Austrália, Colômbia, Peru, Coréia ou Indonésia foram mais altas que 4%. E nenhum ano em que a taxa de juros reais no Brasil foi menor que 4%. Se você conseguir bolar uma teoria que explique taxas de juros reais de equilíbrio no Brasil acima de 4% e de 2% ou menos para esses países, eu lhe garanto um futuro bem promissor no mercado acadêmico.

“Ou seja, o ponto não é de juros HOJE, mas sim, de juros em 2011. Políticos no lugar do Lula agora não gerariam a mudança em disciplina fiscal necessária para baixar os juros a 5%.”

Os juros deveriam ser 5% ou menos desde julho deste ano. Isso não aconteceu por um único motivo: fazer isso significaria o fim do crédito direcionado.

"O" Anonimo disse...

“Isso não foi uma entrevista isolada, ele reiteradamente acena com o Serra-ignorante. Não dá para ficar ignorando isso e acreditando no Serra-mentiroso.”

Relaxa, Tiago. Todas as indicações que eu tenho é que se Serra for eleito, o comando da economia vai estar nas mãos de economistas com um longo histórico de advocacia por um ajuste fiscal permanente.

Anônimo disse...

"O que eu quis dizer é que a política fiscal deve ser utilizada como último recurso quando não há espaço algum para a política monetária, e isso acontece quando os juros nominais estão perto de zero."

Nossa essa frase está muito errada...

Ainda há muito espaço para política monetária expansiva quando as taxas são zero.

Começa a ler o Scott Sumner, ou mesmo o Krugman quando ele resolve ser economista:

http://krugman.blogs.nytimes.com/2009/11/13/its-the-stupidity-economy/?pagemode=print

"O" Anonimo disse...
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Anônimo disse...
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"O" Anonimo disse...

Caro anônimo,

Meu erro foi ter superestimado sua capacidade analítica e de interpretação de texto e tomado sua crítica sobre minha frase pelo seu valor de face.

Examinando novamente o que escrevi (leia abaixo), reafirmo que a frase é irretocável:

“O que eu quis dizer é que a política fiscal deve ser utilizada como último recurso quando não há espaço algum para a política monetária, e isso acontece quando os juros nominais estão perto de zero.”

Abraços,

Tio “O”

Anônimo disse...
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"O" Anonimo disse...

“1. Há espaço para política monetária quando os juros nominais estão perto de zero (se vc não concorda com isso então não entendeu o debate), o que já torna a sua frase falsa,”

Não, não e não. Como eu disse, eu superestimei sua capacidade lógico-analítica.

Minha frase não implica o que você diz que ela implica. Eu disse que a política fiscal deve ser utilizada como último recurso e que isso acontece quando os juros nominais estão perto de zero (e no caso brasileiro, eles não estavam, portanto a alavanquinha da política fiscal não deveria ter sido puxada).

Esta afirmação é perfeitamente consistente com a possibilidade que haja recursos outros além da política fiscal quando os juros nominais estão perto de zero.

Minha frase é irretocável. Agora, volta para sua tocatoca (por caridade, não vou responder a seu item #2).

Anônimo disse...
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"O" Anonimo disse...
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Anônimo disse...

`O`....Divulga as informacoes ai....Samuca no lugar do mantega?????

Anônimo disse...

"Que você perdeu a discussão e a compostura."

Você tem merecida fama de má-educação; e

aprenda a ler o que escreve.

Michel disse...

"O", voltando rapidamente ao debate original (paro depois desse...)

"No que ele [o Serra, reclamando das taxas de juros permanentemente altas] está perfeitamente correto.

Enquanto o Bacen estava construindo sua credibilidade, fez sentido termos juros reais altos, mas isso é passado, foi um período transicional que passou."

Verdade, as taxas de juros brasileiras são altas e eu não sei explicá-las. Agora, o que um político pode fazer para alterar essa situação se, como você mesmo disse, nós não fazemos a menor idéia do que explica esse diferencial de juros? Não é uma proposta política decente simplesmente baixar os juros no decreto e torcer para que as expectativas não fiquem malucas. Os modelos keynesianos são modelos de múltiplos equilíbrios e não sabemos como ocorre a transição entre esses equilíbrios. Por isso, uma intervenção sobre nível de juros para "trazer desenvolvimento" (nos termos do Serra) é algo bem arriscado. O meu problema com o comentário do Serra é simplesmente que a explicação focal dele pra trazer desenvolvimento para o país é arranjar um jeito de baixar juros (e elevar a taxa de câmbio, que eu vou deixar de lado por ser baboseira explícita). Falar nos juros como causa focal do baixo crescimento brasileiro é equivalente a se propor a não fazer nada, ou fazer uma política incrivelmente arriscada, cujo efeito sobre expectativas, formação de preços e outros é completamente desconhecido.

Verdade, o BACEN tem credibilidade agora, mas (i) a credibilidade é endógena às decisões de juros, (ii) Não existem garantias legais de independência e da possibilidade de sustentar um regime crível de metas de inflação.

"Quanto à sua teoria, eu não faço a mínima idéia qual a conexão entre ‘taxação de capital ineficiente’ e (...) taxas de juros reais"

Taxação de capital implica em queda na oferta de capital, maiores retornos à utilização do capital e maiores taxas de juros reais (pelo menos pré impostos). Não que isso explique as diferenças de taxas de juros no Brasil e Turquia vs. outros países.

"Os juros deveriam ser 5% ou menos desde julho deste ano. Isso não aconteceu por um único motivo: fazer isso significaria o fim do crédito direcionado."

Voltando: crédito subsidiado via BNDES e crédito para moradia via poupança são formas de redistribuição. Eu não sei, mas acho difícil acreditar que algum político teria coragem para mexer na poupança, mesmo em início de governo. Acho que existe um componente forte de que a sociedade escolhe politicamente ter crédito subsidiado para moradias, e políticos que forem mudar essas regras têm boas chances de perder popularidade. Nem o Lula, nem o Serra, nem quem fosse político alteraria as regras de poupança agora para baixar juros.

Concordo com o penúltimo anônimo, não sei falar muito sobre o debate trazido pelo último anônimo.

"O" Anonimo disse...

“Verdade, as taxas de juros brasileiras são altas e eu não sei explicá-las. Agora, o que um político pode fazer para alterar essa situação se, como você mesmo disse, nós não fazemos a menor idéia do que explica esse diferencial de juros?”

Que nós concordemos que esse diferencial de juros não pode ser explicado dentro da teoria econômica parece-me uma indicação bem forte – tão forte quanto qualquer indicação que podemos ter em macroeconomia – que estamos lidando com um desvio dos fundamentos, uma distorção.

“Não é uma proposta política decente simplesmente baixar os juros no decreto e torcer para que as expectativas não fiquem malucas. Os modelos keynesianos são modelos de múltiplos equilíbrios e não sabemos como ocorre a transição entre esses equilíbrios.”

O papel do político é moldar a realidade. A administração atual perdeu a oportunidade de aproveitar a crise para mudar com as regras da poupança e abaixar a SELIC a níveis colombianos (!) ou australianos. A comunidade financeira internacional inteirinha teria aplaudido. (Aliás, não duvido que o Brasil tenha sido pressionado durante as reuniões do G-20 para fazer exatamente isso).

“Por isso, uma intervenção sobre nível de juros para "trazer desenvolvimento" (nos termos do Serra) é algo bem arriscado. O meu problema com o comentário do Serra é simplesmente que a explicação focal dele pra trazer desenvolvimento para o país é arranjar um jeito de baixar juros (e elevar a taxa de câmbio, que eu vou deixar de lado por ser baboseira explícita). Falar nos juros como causa focal do baixo crescimento brasileiro é equivalente a se propor a não fazer nada, ou fazer uma política incrivelmente arriscada, cujo efeito sobre expectativas, formação de preços e outros é completamente desconhecido.”

Você está escrevendo um tratado pelo elogio à inação. As expectativas podem ser moldadas. Basta lançar simultaneamente um pacote crível de medidas fiscais (ex: um orçamento de médio prazo prevendo crescimento dos salários nominais do funcionalismo a 4.5% ao ano por 4 anos).

“Voltando: crédito subsidiado via BNDES e crédito para moradia via poupança são formas de redistribuição.”

O primeiro é redistribuição dos trabalhadores para os acionistas da Vale e da Petrobrás (o que deve aumentar a demanda por escritórios com vista para o Central Park), o Antonio Ermírio de Moraes e o grupo JBS. Duvido que exista alguma outra política mais Robin Hood às avessas que a carteira de crédito do BNDES.

O segundo é tão irrelevante quanto o tamanho de nosso mercado de crédito habitacional, que é ínfimo.

“Eu não sei, mas acho difícil acreditar que algum político teria coragem para mexer na poupança, mesmo em início de governo.”

Eu acho que o custo político é mínimo, posso estar errado. Mas de todo modo, qualquer presidente que não tem coragem de mudar uma regrinha dessas não merece ser nem síndico de meu condomínio.

Guilherme Lichand disse...

"(...) e elevar a taxa de câmbio, que eu vou deixar de lado por ser baboseira explícita"

estou impressionado, você me convenceu ein

Michel disse...

Lichand: hahahahaha...com toda certeza...eu num tentei convencer ninguém de nada sobre taxa de câmbio...acho que o tópico geral do meu comentário era claramente taxa de juros.

"O": O ensaio a inação é muito mais uma filosofia de que a gente não deve agir em uma coisa que não conhecemos. Existem muitas coisas que o Brasil precisa fazer para obter crescimento sustentável, com retornos comprovadamente maiores do que os de muitos investimentos em capital físico (ex.: educação, criação de direitos de propriedade mais bem desenvolvidos, melhora na eficiência do judiciário) que focar na taxa de juros (que, de novo, está associada a uma política arriscada) me parece ser atirar pro lado errado.

Por fim, a redistribuição as avessas faz parte da política e, se poder político está associado a poder econômico, a desigualdade econômica brasileira intensifica também essa redistribuição as avessas (via lobbies/pressao política/mecanismos de política de facto).

lucas disse...

por isso é melhor usar a palavra transferências do que redistribuição, que dá a idéia - mesmo que a rigor a palavra possa ser usada em ambos sentidos - de que o dinheiro está indo dos ricos aos mais pobres.

"O" Anonimo disse...

""O": O ensaio a inação é muito mais uma filosofia de que a gente não deve agir em uma coisa que não conhecemos. "

De fato, existem riscos em qualquer mudanca de política. Inclusive em aumentar gastos com educacão (uma populacão com mais educacão do que requer sua ocupacão tende a abracar radicalismos).

O que faz mais desolador ainda reconhecer a oportunidade que o governo perdeu em 2009 quando as condicões eram propícias.

Anônimo disse...

Nada do que o Serra fez até hoje na área fiscal me dá indícios de que é válida a hipótese do Serra-mentiroso..



Doutrinador